quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

“A Relíquia”, de Eça de Queiroz – da “Biblioteca Universal” – Rabi Robã muda o foco e, em vez das polêmicas religiosas, problematiza a ofensa do Réu da Galileia ao poder romano local; Pilatos percebe a trama dos fariseus e dá a entender que tem o apoio imperial; prevaricação?

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/12/a-reliquia-de-eca-de-queiroz-da_28.html antes de ler esta postagem:

As palavras de Pilatos foram ouvidas pelos que acompanhavam Sareias. Eles trocaram alguns sussurros e começaram a recuar...
Quem permaneceu no limiar da porta foi o Rabi Robã com o seu longo manto azul. Desde sua tiara uma joia brilhava e, com os longos cabelos grisalhos, conferia-lhe autoridade e serenidade.
(...)
Rabi Robã levantou a mão e no mesmo instante os demais pararam para ouvi-lo. O velho dirigiu-se a Pilatos chamando-o “oficial de César, muito justo e muito sábio”... Depois iniciou sua falação dizendo que o homem que ele chamava de “visionário” vinha há muitos anos ofendendo as leis locais e blasfemando...
O sábio homem “disse mais do mesmo”... Quer dizer, ele sabia que aquelas acusações de cunho religioso não afetavam o poder político romano na região... Então, na sequência, chamou a atenção para o fato de jamais O terem prendido. Isso só ocorreu depois que Ele entrou triunfalmente pela Porta de Ouro e sendo aclamado como Rei da Judeia.
Rabi Robã levantava um questionamento grave... Disse que a Judeia não tinha outro rei senão Tibério que governava Roma... Afirmou que apenas um sedicioso se autoproclamava rei! O que estavam esperando para castigá-Lo?
O velho argumentou que ele e os que o acompanhavam se apressaram a tomar providências e O condenaram. E nem sequer tinham mandato de César! Dito isto, restava saber se Pôncio, um oficial do imperador, insistiria em livrar o rebelde que se levantava contra a autoridade imperial.
(...)
Pilatos enrubesceu... Ele percebeu que sua retidão era o motivo da indignação do Rabi Robã e dos demais... Sem dúvida notou a incoerência dos judeus ali presentes... Todos execravam Roma, no entanto, para alimentar o ódio que seus sacerdotes nutriam pelo Réu da Galileia, queriam ser vistos como zelosos em relação ao poder imperial.
Aquilo pareceu demais para Pilatos... E foi por isso que exclamou sem pestanejar que os que o haviam solicitado para aquela improvisada audiência deviam cessar a falação... Emendou que procuradores de César não se transferiam para as “colônias bárbaras” para aprender sobre seus deveres para com o império...
(...)
Manassés o ouvia sem esconder sua agitação... Puxou a barba e afastou-se do grupo.
Já o Rabi Robã mostrou indiferença às palavras do pretor... Com sua habitual calma, perguntou o que faria o procurador do império em Alexandria se um “visionário” aparecesse desde Bubastes a se proclamar “rei do Egito”... O velho mesmo respondeu que o procurador de César na Alexandria faria exatamente o que Pôncio não queria fazer naquelas paragens bárbaras da Ásia.
Depois, recorrendo à metáfora como anteriormente fizera Manassés, Rabi Robã disse que “o amo entrega sua vinha ao criado, que deve guardá-la”, e foi então que questionou: este permitiria que entrassem nela e que a vindimassem?
(...)
Rabi Robã não mediu palavras... Perguntou a Pilatos qual era a razão de estar na Judeia... Para que a sexta legião estava instalada na Torre Antônia?
Como que a concluir seu desabafo, o velho sentenciou que a voz de seus companheiros era “clara e alta bastante” para chegar aos ouvidos do imperador.
Pilatos adiantou-se um pouco em direção à porta e olhou fixamente para os judeus... Ele sabia que o estavam encurralando numa trama de rancores religiosos... Encheu-se de dignidade e disse que não receava suas intrigas... Garantiu que Elio Lama era seu amigo e que o imperador o conhecia bem.
Ao que parece, as palavras de Pilatos o envolveram ainda mais na trama que o velho estava formatando... Na sequência, Rabi Robã vociferou uma série de juízos que levantavam graves suspeitas contra o modo de proceder do pretor. Ao mesmo tempo, isso fortaleceu a confiança de seus seguidores.
Mas isso fica para a próxima.
Leia: A Relíquia – Coleção “Biblioteca Universal”. Editora Três.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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