sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

“A Relíquia”, de Eça de Queiroz – da “Biblioteca Universal” – o pretor fala de sua lealdade ao imperador e a respeito de concessões aos sacerdotes locais; “lavando as mãos”; a pena máxima se aproxima; Teodoricus adormece, “sono no sonho de Teodorico”; concentração de negociantes nas imediações do Pretório

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/12/a-reliquia-de-eca-de-queiroz-da_53.html antes de ler esta postagem:

Pilatos entendeu que precisava se justificar...
Começou a falar que já fazia sete anos que governava a Judeia... Perguntou se Rabi Robã ou um de seus liderados poderia confirmar se durante aquele período o viram cometer injustiças ou se o flagraram praticando alguma infidelidade ao império...
Empalideceu... Mas isso não o impediu de dizer que as ameaças que tinha acabado de ouvir não o intimidavam. Destacou que sempre fizera concessões às autoridades sacerdotais. Justificou que agira dessa forma para proveito da ordem e do imperador.
Garantiu que o imperador o conhecia bem... Era para que não houvesse desacordos que fizera concessões. Lembrou que desde Copônio, nenhum outro procurador respeitara tanto as leis judaicas quanto ele. Acrescentou que mandara supliciar os dois homens de Samaria que apareceram para “poluir o templo”.
Ele queria deixar claro que não desejava dissensões, mal entendidos ou troca de “palavras amargas”...
Os fariseus ouviram o pretor... Diante da porta de cedro o silêncio se fez... De repente ele interrompeu a falação e pareceu hesitar. Logo esfregou e sacudiu as mãos como se as tivesse mergulhado numa vasilha de águas impuras.
Na sequência perguntou se queriam mesmo a vida do “visionário”... Sentenciou que não se importava com isso e podiam tomá-lo. Se achavam a flagelação insuficiente e pretendiam crucificá-lo, podiam fazê-lo.
Por fim ressaltou que nada tinha a ver com o derramamento daquele sangue... No mesmo instante um dos levitas disparou com paixão que eram eles que pretendiam que o sangue de Jesus fosse derramado em suas próprias cabeças.
(...)
As palavras do levita fizeram alguns estremecer... Talvez considerassem mesmo que poderes sobrenaturais podem tornar vivas as coisas pensadas.
Pilatos voltou-se para o interior da sala e desapareceu... O decurião fez uma saudação aos que acompanhavam Sareias e o Rabi Robã e depois trancou a porta de cedro.
Rabi Robã estava sereno e “resplandecente como um justo”, declarou que era preferível que um homem só sofresse, pois o povo inteiro é que não devia padecer... Alguns fariseus seguravam sua túnica e a beijavam...

(...)
Teodoricus se emocionou... Atirou-se sobre um banco e procurou algum ponto onde pudesse fixar o olhar... Notou dois legionários que tinham folgado os cinturões e bebiam de um recipiente constantemente abastecido por um negro que trazia o odre acomodado nos ombros... Mais adiante estava uma mulher de destacada beleza e força a sustentar os filhos junto aos peitos nus... Mais distante ainda via-se um pastor carregado de peles a exibir o braço ensanguentado.
Na sequência o rapaz fechou os olhos... Sentiu-se ainda mais confuso ao notar que pensava na vela toda fumarenta e vermelha que deixara junto à sua cama na tenda.
Depois adormeceu.
(...)

Ao despertar, observou que a cadeira reservada para o pretor estava vazia. À frente dela estava a almofada gasta pelos pés de Pilatos... Do átrio chegava o murmúrio da grande concentração de pessoas... Uma multidão!
Entre os presentes, havia muitos homens rudes que usavam capas curtas e empoeiradas das lajes das praças... Não poucos traziam balanças e gaiolas em suas mãos. Mulheres que os acompanhavam esbravejavam contra o Réu da Galileia... Todavia algumas delas estavam mais preocupadas em anunciar mercadorias que traziam nas dobras de suas vestes (grãos de aveia torrada, potes com óleos unguentos, corais, braceletes elaborados com fios metálicos de Sídron...).
Leia: A Relíquia – Coleção “Biblioteca Universal”. Editora Três.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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