quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

“A Relíquia”, de Eça de Queiroz – da “Biblioteca Universal” – antiga e tortuosa rua de Jerusalém; miseráveis moradores e seu cotidiano; uma luxuosa casa de banhos

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/12/a-reliquia-de-eca-de-queiroz-da.html antes de ler esta postagem:

Mas é claro que trata-se de um sonho! Do longo sonho de Teodorico.
Como se pode depreender, ele prosseguiu na espetacular jornada rumo a Jerusalém reconhecendo que algumas circunstâncias pareciam anacrônicas... Mas não o vemos problematizar sistematicamente.
Aquelas terras bíblicas haviam “parado no tempo”? Ele e o douto Topsius voltaram ao passado?
(...)
O homem que chegou agitado ao acampamento conclamando galileus e peregrinos de Neftali mostrava-se indignado com a prisão do Rabi Jeschoua...
No mesmo instante Topsius entendeu perfeitamente e, sem entrar em detalhes, chamou a atenção do companheiro Teodorico. Aquele era um evento extraordinário.
Os dois estavam vivenciando os episódios da Paixão de Cristo!
O sábio alemão sabia que Jeschoua era Jesus. Ele já havia sido conduzido ao Sinédrio...
Muito ainda estava por ocorrer e ele queria presenciar os fatos.
(...)
Topsius explicou que deviam seguir imediatamente à casa de certo Gamaliel. Assim, no momento mesmo em que o sol já estava bem alto, os dois passaram “pela porta do Pescado” e avançaram por uma antiga rua íngreme de Jerusalém.
As habitações do lugar eram muito simples... Todas tinham tijolinhos à vista. Suas portas estavam travadas de modo rudimentar e nas janelas viam-se frutos e palmas que lembravam a época da Páscoa. Numa ou noutra havia mulheres ajeitando a frente do lar.
Durante a tortuosa subida, Teodorico pôde observar os traços de um egípcio que caminhava quase que ao seu lado... O tipo carregava uma harpa às costas e tinha uma pluma de cor escarlate enfeitando a peruca... Na altura da cintura ele levava um tecido branco, e nos braços várias bijuterias.
Topsius quis saber do egípcio se ele vinha de Alexandria e se as “cantigas da batalha de Ácio” ainda eram entoadas nas diversas tabernas do Eunotos... O tipo sorriu e deu a entender que iniciaria uma cantiga, então os dois estrangeiros fizeram as éguas trotarem mais ligeiramente.
(...)
Mais à frente, umas senhoras com seus véus amarelos e suas pombas de oferenda ao templo se assustaram com a passagem dos dois apressados cavaleiros.
Das casinhas vinha um cheiro de comida sendo preparada em fogões rudimentares. Teodorico
notou mesmo umas armações com caçarolas... Prevalecia o “cheiro acre de alho”.
Crianças brincavam nuas e raspavam abóboras cruas em meio à poeira. As pobrezinhas não conseguiam se livrar de moscas que orbitavam suas cabeças... Elas estavam esfomeadas e tinham a barriga cheia de vermes.
Alguns pastores aguardavam diante de uma oficina de ferreiro. Do outro lado estava um negro anunciando bolos de centeio com formatos obscenos. Na sequência passaram por uma praça que estava sendo reformada... Diante dela havia uma casa de banhos no melhor estilo romano. Escravos nus percorriam os pátios conduzindo as essências reclamadas pelos banhistas. O aroma naquele trecho era mesmo de calor e perfume... Na entrada reservada às mulheres encontrava-se uma figura feminina de face arredondada e lábios grossos. Teodorico encheu-se de encantamento ao notar sua “nudez babilônica”.
Aos pés dessa “sacerdotisa misteriosa” de pesada maquiagem estava posicionada uma escrava negra que manipulava um grande leque... De acordo com Teodorico, a bela figura “lasciva e pontifical” lembrava os rituais de Astarté e de Adônis.
O português tanto se encantou que comentou com Topsius que desejava dirigir-se aos banhos... Mas o alemão foi severo ao dizer que Gamaliel, “filho de Simeão”, os aguardava... E emendou que, para aquele que os receberia, “mulher é o caminho da iniquidade”.
Leia: A Relíquia – Coleção “Biblioteca Universal”. Editora Três.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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