Anne não podia crer que Nadine fosse se resolver no matrimônio... Devotar-se a marido e filho? Não era bem para isso que a garota dedicara sua existência até então...
Além disso, preocupava-se com a possibilidade de Henri a desposá-la por obrigação... Se isso ocorresse era bem provável que as coisas não terminassem bem para os dois.
Apesar de seus receios, ela não o procurou para uma conversa... Certa noite ele apareceu e foi direto ao seu quarto... Cumprimentaram-se e Henri brincou ao perguntar se era daquela forma que costumava trabalhar... Dirigiu-se ao divã e, ainda em tom divertido, disse que se sentia “desesperadamente normal”... Tratava-se de situação duvidosa?
Anne respondeu que a afirmação e a condição anunciada eram muito duvidosas... O humor de Henri estava excelente, então emendou que tinha necessidade de se tratar...
É claro que essa não era a razão de sua visita... Explicou que estava lhe pedindo a mão de Nadine em casamento... Anne sorriu e perguntou se ele seria um bom marido... Ele garantiu que se esforçaria... Ela redarguiu que se o casamento fosse motivado apenas pelos caprichos de Nadine teria motivos para desconfiar.
Henri disse que não havia razão para recearem... Deixou escapar que a experiência com Paule servira-lhe de lição... Depois admitiu gostar de Nadine e que podia mesmo ser um bom pai de família.
Anne não se demonstrou convencida... O rapaz notou e assegurou que ele mesmo se surpreendera ao experimentar um choque no coração ao saber que Nadine estava grávida... A criança nada tinha a ver com seus personagens de romances e peças. Isso o empolgava.
Anne ouviu com atenção e depois disse que também ela precisava descobrir depressa “uma vocação de avó”... Quis saber se pretendiam casar-se em breve, se haviam pensado em um apartamento...
Henri explicou que não tinham interesse de permanecer em Paris. Provavelmente seguiriam para a Itália, onde alugariam uma casa... Ressaltou que não tiveram tempo de planejar muita coisa... Anne sugeriu a casa em Saint-Martin.
(...)
Nadine não só não descartou a ideia como preparou dois quartos grandes
no segundo andar... Por motivos óbvios deixou o pavilhão de lado (o ambiente
trazia-lhe desagradáveis recordações da época em que vivera com Lambert).
Ela parou de trabalhar na Vigilance
e passou a estudar livros de puericultura... Também tricotou um colorido
enxoval.
(...)
Anne observou que ao seu
redor tudo parecia correr muito bem.
Henri afastara-se dos
“tormentos da vida política”... Robert sentia-se bem e não dava falta de Nadine
e do noivo... Paule continuava deslumbrada com o seu novo modo de ser.
(...)
Paule instalara-se
mesmo na mansão de Claudie Belzunce, onde servia como secretária...
Sua rotina passou a ser marcada por muitos passeios e festas nas quais
Claudie fazia questão de leva-la... Os vestidos que usava nessas ocasiões eram
emprestados pela própria Belzunce.
Paule contava a Anne sobre
os eventos e os amantes que conhecia... Insistia com a amiga para que ela
participasse mais da “vida social mais elegante”... Estava feliz com o glamour
e desejava o mesmo para Anne.
Não foi por acaso que Anne passou a desconfiar das
funções de secretária exercidas por Paule... Havia algo misterioso por trás de
tanta extravagância.
Certa vez, Paule sugeriu a Anne que mandasse fazer um vestido para a
noite... Ela precisava vestir-se melhor, mostrar-se... Mostrar-se a quem? Anne
insistia em saber.
Paule perguntou sobre o tecido indígena (o huipil
colorido) que Anne havia trazido da excursão à América Central... A moça ficou
tão agitada com a própria ideia que passou a revirar os armários da amiga até
encontrar o pacote...
Anne segurou o pano e lembrou-se imediatamente da ocasião em que Lewis o
havia dado numa distante cidade indígena... Os incensos rituais impregnaram-se
em sua memória.
Paule notou que a peça era muito importante para Anne, então prometeu
que conseguiria uma costura elegante para ela... Certamente Claudie
encarregaria um profissional de sua confiança para lidar com a peça...
Em troca ela pedia a Anne que comparecesse a um evento noturno na mansão
(na quinta-feira seguinte)... Revelou que havia garantido a Claudie que
conseguiria convencê-la a participar.
Anne não se mostrou à vontade para participar de
qualquer reunião promovida por Belzunce... Mas comprometeu-se a ir por breve
momento.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/07/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_78.html
Leia: Os
Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto