segunda-feira, 11 de julho de 2016

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – fim do encontro no “Ange Noir”; muito uísque e reflexões de Anne sobre o rumo que daria à sua existência; noite mal dormida e opinião de Robert sobre a dificuldade de adaptação numa realidade totalmente diferente e distante dos antigos conhecidos

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/07/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir.html antes de ler esta postagem:

Anne disse que não era por devotamento que continuava com Robert... Paule respondeu que se fosse apenas por hábito, estava claro que aquilo não tinha a menor importância... Ela julgava que ambas eram ainda “moças demais” para se manterem resignadas. A experiência pela qual passara durante o tratamento psiquiátrico com o doutor Mardrus a tornara uma mulher feliz.
Paule não percebia, mas de sua face escorreram algumas lágrimas. Talvez chorasse pelo amor de dez anos devotados a Henri... No fundo aquilo se tornara uma “chaga vergonhosa”...
Anne sorveu outro gole de uísque e também teve vontade de derramar lágrimas... Depois concluiu que jamais espalharia ao vento, e a rir sardonicamente, as cinzas de seu passado como a outra... Preferiria “morrer de sofrimento”.
(...)
Anne também esvaziou seu copo... Apertou-o com força enquanto refletiu sobre a própria situação... Apesar de sua crítica, tinha consciência de que não seria difícil chegar à mesma condição de Paule...
Também ela não conseguiria salvar o próprio passado em sua totalidade.
Em seus pensamentos divisava uma vida de fidelidade a Robert, a quem ela contava bem pouco... Em suas recordações estaria Lewis, a quem ela havia sido tudo... Certamente sentiria imenso pesar no mais fundo de sua memória.
Paule prosseguiu falando... Anne não mais lhe ouvia... Mergulhada em seus pensamentos lamentava a condição em que se via condenando Lewis... Sabia que ela mesma não lhe dera esperanças de futuro para o relacionamento... Sentia o peso das palavras de Paule, “a Robert bastavam papéis e tempo para escrever”...
E como aquilo fazia sentido! Visualizou o escritório “tão cheio” sem a sua presença... Não adiantava esforçar-se para descobrir em si mesma alguma importância, pois “nos domínios que contavam para Robert” ela não tinha nenhuma valia.
Robert era um indivíduo ensimesmado e autossuficiente “em face dos seus verdadeiros problemas”... Lewis era o homem que a desejava, que a queria entre os braços... Pelo menos essa era a sua tese... O amor seria massacrado por sua opção... Lewis distante... Robert próximo... Um reclamava sua presença; O outro jamais havia pedido nada, embora ela fosse capaz de dar a vida por ele.
(...)
Mais uísque...
Poderia se instalar em Chicago. Eventualmente retornaria para Paris, onde encontraria Robert, seu sorriso e solicitude. Não era fácil imaginar isso mesmo que se considerasse que, para ele não houvesse nenhum indicativo de separação.
É certo que, para Anne, o drama continuaria... A opção de permanecer junto a Robert resultaria em futuros remorsos.
(...)
O encontro com Paule chegou ao fim.
Anne retornou para casa muito tarde. A bebida não lhe fizera bem... Dormiu mal...
Na manhã seguinte explicou a Robert os motivos de sua feição abatida. Ele perguntou-lhe se lamentava ter regressado da América... Anne respondeu que não sabia ao certo e que, de certo modo, achava absurdo o fato de ter deixado para trás o ambiente onde era requisitada, onde havia quem necessitava dela.
Robert perguntou-lhe se acreditava que poderia viver na América, se seria feliz... Ela respondeu que tentaria esse projeto se ele não existisse... Ele ponderou que talvez ela não conseguisse viver sem os amigos, sem ocupação e cercada por pessoas com outros costumes e que sequer falavam a sua língua... Seria uma ruptura em relação ao passado e a “tudo o que é importante” em sua existência.
Para Robert, Anne não suportaria por muito tempo a mudança radical...
Ela passou a refletir sobre isso.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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