Tanto a Declaração de Independência dos Estados Unidos quanto a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão tinham suas bases em afirmações de “autoevidência”. Na primeira lemos que os congressistas levavam em consideração “verdades autoevidentes” para legitimar suas reivindicações, já a Declaração francesa deixava claro que os “males públicos e das corrupções de governo” eram causados pela “ignorância, negligência ou o menosprezo dos direitos do homem”. Essa afirmação pressupõe uma “autoevidência” dos direitos (já que eram negligenciados ou menosprezados pelos dirigentes políticos ou pelos mais favorecidos da sociedade).
Também a Declaração de 1948 introduz os direitos partindo desse ponto de vista... O texto apresenta um fragmento que, marcado por formalidade legislativa, corrobora com o caráter de “autoevidência” dos direitos elementares:
"Visto que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo (...)".
Neste ponto a autora esclarece que o “visto que” do início do trecho deve ser entendido como “sendo fato que”, ou seja, “visto que” é “um modo legalista de afirmar algo determinado, autoevidente”.
(...)
A
questão que se pode levantar é, dado que “a igualdade dos direitos é tão
autoevidente”, por que a afirmação devia ser proclamada? E por que em épocas e
locais específicos?
Se
há a necessidade proclamar os direitos, é porque eles não são reconhecidos! Aí
há um paradoxo... Eles são universais, mas não são “universalmente reconhecidos”!
Se os direitos são mesmo autoevidentes, então por que estudiosos e teóricos
diversos discutem o assunto há tanto tempo?
Thomas Jefferson fez a afirmação a respeito da autoevidência
dos direitos sem jamais sentir a necessidade de explicá-la. Suas considerações
foram analisadas pelo “Comitê dos Cinco”* e aprovadas pelo Congresso e, apesar
de algumas modificações, ninguém cogitou revisar o juízo em questão (de que “todos
os homens são criados iguais, dotados pelo seu Criador de certos Direitos
inalienáveis, que entre estes estão a Vida, a Liberdade e a busca da
Felicidade” e que estas são “verdades autoevidentes”).
* a partir das notas
do livro: comitê
formado por Thomas Jefferson, John Adams. Benjamin Franklin, Robert Livingston
e Roger Sherman com o objetivo de elaborar a Declaração de Independência; foi
constituído por determinação do Congresso a 11 de junho de 1776.
Devemos
considerar ainda que, se Thomas Jefferson tivesse de explicar a premissa, e em
que ela se fundamentava, a “autoevidência” da afirmação perderia o seu principal
sentido.
(...)
Essa ideia de “autoevidência” relacionada aos direitos é
muito importante para a discussão que envolve os “direitos humanos”, e
sobretudo para a história que Lynn Hunt pretende contar.
O que até aqui se expôs dá conta que durante o século
XVIII (e a partir dele) a tal evidência em torno dos direitos tornou-se
convincente para os que se debruçaram sobre a necessidade de se estabelecer os
parâmetros para a organização da sociedade em plena transformação.
Muitas vezes os estudos nos levam a concluir que a
história dos direitos está inserida na “história da civilização ocidental”
desde as contribuições de gregos e romanos da antiguidade clássica... Novamente
a autora nos leva a pensar sobre outra instigante questão: entre os antigos
babilônicos, hindus, budistas ou islamitas, não se desenvolveram princípios
relacionados aos mesmos direitos?
Para encerrar, precisamos levar em conta que “direitos
humanos” demandam três “qualidades encadeadas”. Eles devem ser:
*
naturais (inerentes nos seres humanos);
* iguais
(os mesmos para todo mundo);
*
universais (aplicáveis por toda parte).
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/08/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_16.html
Leia: A
Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto