Lynn Hunt destaca que a leitura dos relatos sobre as terríveis torturas judiciais e também dos romances que seguiam o roteiro de cartas que revelavam situações de opressão de jovens indefesas pode ter contribuído para significativas mudanças de consciência em relação ao sofrimento dos demais.
A empatia que daí resultou deve ter contribuído para a construção de “novos conceitos” que viriam a ser aplicados à sociedade e organização política desejáveis. Isso deve ter fortalecido a ideia de que há direitos humanos “autoevidentes”... Talvez os especialistas em “biologia cerebral” pudessem contribuir mais significativamente para a problematização sugerida.
(...)
No início de “A Invenção dos Direitos Humanos” lemos em
destaque que a Declaração de Independência dos Estados Unidos teve o início de
sua elaboração ainda em junho de 1776, e que Thomas Jefferson a submeteu a
algumas revisões até chegar à produção textual sobre algumas “verdades
autoevidentes”:
“Consideramos
estas verdades autoevidentes: que todos os homens são criados iguais, dotados
pelo seu Criador de certos Direitos inalienáveis, que entre estes estão a Vida,
a Liberdade e a busca da Felicidade”.
Lynn
Hunt ressalta que a frase fez do documento, bem típico do século XVIII acerca
das injustiças políticas, uma “proclamação duradoura dos direitos humanos”.
Em 1789, Jefferson encontrava-se em Paris no momento
em que os revolucionários franceses se articulavam para redigir uma declaração
que proclamasse à sociedade a legitimidade das ações em torno dos direitos que
almejavam. Em janeiro desse ano, portanto bem antes da “Queda da Bastilha”, o
marquês de Lafayette, que era amigo de Jefferson e havia participado da Guerra
de Independência dos Estados Unidos, esboçou uma declaração que pode ter
contado com a contribuição do líder norte-americano.
Após
o 14 de julho (Queda da Bastilha) a suposta declaração tornou-se inevitável.
Diferentemente da norte-americana, que foi redigida apenas por Jefferson, a que
havia sido esboçada por Lafayette foi praticamente substituída pelos artigos
elencados pelo comitê de quarenta deputados reunidos desde 20 de agosto.
(...)
É
a própria autora que define o referido comitê como “desajeitado” e sustenta que
o mesmo se perdia em “infindáveis emendas” e discussões... Tanto é que após
seis dias de debates, apenas dezessete artigos (de vinte e quatro) haviam sido
aprovados. No dia 27 a discussão foi suspensa e os artigos aprovados constituíram
a famosa Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Uma das definições de Hunt para o documento é “espantoso”
em relação à simplicidade e à impetuosidade. Tomando por base as informações
sobre o modo como foi discutido e votado, só podia resultar em “desajeitado”. Sem
qualquer referência a “rei, nobreza ou igreja”, a Declaração anuncia que “os
direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem” devem estar nos
fundamentos “de todo e qualquer governo”...
A Declaração anunciava que “todos são iguais perante à lei”
e que a soberania não devia ser enxergada na pessoa do rei, mas sim na própria
nação. Dava-se a entender que os tempos haviam mudado, pois o nascimento não
definiria mais nenhum privilégio.
A igualdade perante a lei proporcionaria oportunidades,
então o mérito e o talento de cada um passaria a contar decisivamente na busca
da realização pessoal. O documento universalizava o tratamento dispensado ao “povo
francês” e as referências a ele aparecem “eclipsadas” em termos como “homens”, “homem”,
“todo homem”, “todos os homens”, “todos os cidadãos”, “cada cidadão”, “sociedade”
e “toda a sociedade”.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/08/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_1.html
Leia: A
Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto