segunda-feira, 12 de agosto de 2019

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – reações à declaração de 27 de agosto de 1789; a empolgação de Richard Price e a crítica de Edmund Burke; a declaração francesa e sua influência na história da luta pelos direitos humanos; sobre os historicamente excluídos do direito e as críticas aos “fundadores da liberdade”; algumas ponderações sobre os contextos em que viveram

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/08/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_12.html antes de ler esta postagem:

Como não poderia deixar de ser, a declaração provocou imediata reação também fora da França...
Muitos se posicionaram a favor ou contra a temática dos direitos... A autora cita um sermão proferido em Londres no dia 4 de novembro de 1789 por Richard Price, amigo de Benjamin Franklin que criticava veementemente o governo de seu país... Vemos Price entusiasmado com os acontecimentos na França e particularmente em relação à promulgação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. O livro destaca um fragmento que evidencia o anteriormente exposto:

                   “Vivi para ver os direitos dos homens mais bem compreendidos do que nunca, e nações ansiando por liberdade que pareciam ter perdido a ideia do que isso fosse”.

Já o parlamentar inglês Edmund Burke tornou público “Reflexões sobre a Revolução em França”, 1790, panfleto em que manifesta sua indignação em relação aos episódios elogiados por Price. O texto de Burke tornou-se conhecido como “fundador do conservadorismo”. Seguem fragmentos:

                   “Não somos os convertidos por Rousseau (...) Sabemos que não fizemos nenhuma descoberta, e pensamos que nenhuma descoberta deve ser feita, no tocante à moralidade. (...) Não fomos estripados e amarrados para que pudéssemos ser preenchidos como pássaros empalhados num museu, com farelos, trapos e pedaços miseráveis de papel borrado sobre os direitos do homem”.

Os dois intelectuais se posicionaram favoravelmente à Independência dos Estados Unidos, mas, como se vê, a Revolução Francesa acabou colocando em lado opostos os que a viam como triunfo “de uma nova era de liberdade baseada na razão” e os que consideravam que ela podia ser “o início de uma queda implacável rumo à anarquia e à violência”.
Não há como não reconhecer a importância da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão no processo de luta pelos direitos... Apesar de todas as divergências que provocou, o documento “encarnou a promessa de direitos humanos universais. Em seu primeiro artigo lemos que “Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos”... O Artigo I da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) praticamente repete aquela redação: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”.
(...)
Há que se destacar que o texto original de Thomas Jefferson, que passou por várias alterações, não tinha pretensões de se tornar Constituição. Tratava-se de Declaração de Independência e anunciava intenções... Em 1791 os estados norte-americanos votaram e aprovaram a Bill of Rights (a carta dos direitos dos cidadãos norte-americanos; corpo formado pelas dez primeiras emendas à Constituição) inspirada pelo movimento revolucionário e pela declaração de 1776.
Apesar da apologia dos direitos e das liberdades individuais, a Declaração francesa de 27 de agosto de 1789 não foi suficiente para evitar a instauração do governo do Terror que reprimiu liberdades e direitos...
Para todos os que se debruçam sobre a história dos “direitos universais”, tais como admitiam os protagonistas das ideias e lutas revolucionárias do final do século XVIII, fica sempre o dado inquietante a respeito da exclusão que muitos defendiam.
Até é explicável o fato de crianças, insanos, prisioneiros, estrangeiros e incapazes terem sido excluídos dos direitos e, por extensão, considerados indignos de participação nos processos políticos. Mas entre esses também eram enquadrados os mais pobres, escravos, negros libertos, minorias religiosas e mulheres.
(...)
Então é isso... Não há como não problematizar a ideia anunciada em “todos os homens”, pois na prática os direitos não foram estendidos a todos. Muitos comentários foram formulados a partir da polêmica, e não poucos estudiosos passaram a questionar se as declarações tinham mesmo significados relacionados à emancipação das pessoas. Não por acaso, devido às exclusões que apoiaram, declarações e “fundadores da liberdade” vêm sendo chamados por alguns de “elitistas, racistas e misóginos”.
Hunt adverte que todos eles foram personagens que viveram “em sociedades construídas sobre a escravidão”, onde “a subordinação e a subserviência” eram consideradas naturais. Sendo assim, como poderiam “imaginar homens nada parecidos com eles, e em alguns casos também mulheres, como iguais?”
A autora lembra ainda que Jefferson foi proprietário e senhor de escravos, enquanto Lafayette foi aristocrata. Mesmo assim trataram de direitos autoevidentes e inalienáveis.
Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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