A secretária anunciou a chegada de Lenoir... Mas Henri não podia recebê-lo sem antes fazer com que Paule se acalmasse.
Ela insistia em repetir que o amava... Chorava copiosamente ao mesmo tempo em que reclamava que significava muito mais para ele do que o Lenoir que acabara de chegar... Depois, em tom de lamentação, pediu desculpas por ter se envolvido em atividades sociais e de ter ousado escrever... Escreveu, mas era por amor a ele. Queria deixar claro que estava arrependida por ter se mostrado vaidosa... É por isso que em breve queimaria tudo o que havia escrito.
Henri não acreditava no que via e ouvia. Respondeu que seria uma estupidez da parte de sua parte queimar a produção textual... Explicou também que não havia nenhum sentido em agir daquela forma.
Manifestando transtorno jamais demonstrado anteriormente, Paule perguntou se nada poderia convencê-lo a respeito de seu amor... Henri quis que ela se tranquilizasse e, principalmente, que se retirasse... Respondeu que estava “profundamente convencido” a respeito do amor que ela manifestara... Mas, ainda aos prantos, ela disse que o aborrecia e sentia necessidade de dissipar o mal que causara.
(...)
Henri
queria agitá-la, esbofeteá-la para que acreditasse que não havia nenhum mal
entendido... É claro que não faria aquilo, mas o seu desespero aumentava na
medida em que não conseguia livrar-se dela...
Em
seu desvario, Paule continuou a culpar-se dizendo que o aborrecia. Ela estava
convicta de que ele não quereria mais vê-la... Em pensamento Henri
confirmava... Isso mesmo, não tinha o menor interesse em revê-la... Mas
proferiu o contrário: “certamente que sim!”.
Como
não conseguia êxito em despachá-la de uma vez por todas, pediu mais uma vez que
ela se acalmasse... Pôs-se a acariciar os seus cabelos por algum tempo... Enfim
ela decidiu partir. Pediu que ele jurasse que a encontraria no dia seguinte
para almoçarem juntos.
Ele
jurou que almoçariam juntos... Queria ficar livre daquele estorvo... Pensou que
a única solução seria não vê-la nunca mais... Fechou a porta e pensou que podia
ajudá-la com dinheiro... Mas até para isso precisaria encontrá-la
eventualmente... Era algo que ainda o incomodaria.
(...)
Depois
de “despachar” Paule, Henri recebeu Lenoir.
Pediu desculpas pela demora... O outro estava
avermelhado e tossia “uma tosse desagradável”... Ele foi falando que Henri já
devia saber o motivo de sua visita... E este respondeu que certamente era
porque ele devia estar solidário a Dubreuilh.
Henri lamentou o fato de
seu artigo não o ter convencido... Lenoir, dando a entender que compreendia sua
iniciativa, disse que não aceitava a sua argumentação sobre “não querer
esconder a verdade aos leitores” porque seria preciso esclarecer “de que
verdade ele pretendia tratar”.
Henri não esperava
ouvir outra coisa... Sabia que Lenoir viria com aqueles conceitos previamente
selecionados (“verdade ambígua”; “verdade parcial”...)... Logo após foram
despejados os juízos sobre a pressão policial na URSS e o papel que a “pressão
econômica” exerce nos países capitalistas... Ora, na URSS aquilo era legítimo
porque no regime socialista “o operário não está ameaçado de ser despedido nem
tem responsabilidade, no caso de falência”... Lenoir referia-se aos campos como
“formas de sanções”.
Henri deixou claro que os campos de trabalho
forçado significavam uma “sanção muito pesada e desumana”... Em nada podiam ser
associados aos ideais socialistas. Além disso, entre a condição de um
desempregado das sociedades capitalistas e a vida dos trabalhadores dos campos
havia muita diferença...
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/08/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_12.html
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto