Henri aguardava Lenoir. Sua decisão de publicar o artigo das denúncias aos campos soviéticos de trabalho forçado abalou as discussões... Ele sabia que o outro traria críticas ao texto...
Mas, em vez de Lenoir, foi Paule quem primeiro apareceu no escritório de L’Espoir. Ela foi logo se dizendo chocada com o texto... Queria detalhes.
Vimos que Henri disse que havia rompido com Dubreuilh por discordarem a respeito da publicação...
(...)
Surpreendentemente, Paule discordou e exclamou que
“não se rompe com um amigo de vinte e cinco anos, porque não se está de acordo
com ele a respeito de uma infeliz história de política”. A surpresa aí decorre
de que antes ela vivia implicando com o relacionamento entre os dois...
Henri quis esclarecer e disse que não se tratava de uma “história
infeliz sem grande importância”... A moça fez ares de preocupada e manifestou
que o fato de há muito não se falarem como outrora talvez o tenha levado a
essas intrigas... Para ela só havia um remédio... Ele precisava voltar a confiar
plenamente nela. Henri disse que nada havia mudado.
(...)
Mas aconteceu que Paule começou a falar sobre a noite
da estreia da peça, quando teria pressionado Josette... Desculpou-se por ter
sido tão desagradável... Henri não esperava que a visita desencadeasse assunto
mais impertinente... Tentou ser cordial e respondeu que ele é quem lhe devia
desculpas por demonstrar mau humor naquela ocasião...
Paule não aceitou que ele lhe pedisse desculpas... Então passou a falar
que desde a noite do “Ensaio Geral” havia compreendido melhor uma série de
coisas. Enfim, podia dizer com toda a certeza que havia sido muito egoísta...
Ela entendia, e isso o sabia tardiamente, que não havia sido correto pretendê-lo
do modo como ela “o havia sonhado”... Era muita presunção... Sim, ela o
desejava, mas o correto era “querê-lo tal como ele era”.
Para desespero de Henri, a mulher se demonstrava muito pior do que
antes. Ela simplesmente estava admitindo que não era nada, ao passo que ele era
“o tudo”... Paule aceitava sua condição de o “nada ser” e aceitava tudo de
Henri... Era a submissão total!
Henri pediu que ela não se exaltasse... Garantiu que conversariam no dia
seguinte... Paule só queria saber se ele acreditava sinceramente no que ela
dizia, e pedia perdão por ter sido orgulhosa no passado... Não reclamava nada
mais para si mesma: “Só Henri existia e ele podia exigir tudo dela”.
Henri assistia àquela exibição que considerava ridícula ao extremo.
Desejava apenas que ela se retirasse antes da chegada de Lenoir... Disse que
acreditava nela, pediu-lhe paciência e garantiu que conversariam melhor no dia
seguinte, pois precisava trabalhar. Mas Paule queria convencê-lo, e repetia
insistentemente que era inteiramente devotada a ele... O que poderia fazer para
que ele acreditasse? Sugeriu mesmo cortar uma de suas orelhas.
Que situação!
Henri, dando a
entender que brincava, perguntou o que faria com a orelha que lhe fosse
entregue... Paule chorou e respondeu que seria um sinal de seu amor... Ela não
tolerava imaginar que o amado duvidasse de seu amor.
De repente, a secretária abriu a porta
anunciando Lenoir... Henri pediu que o aguardasse por cinco minutos... Depois se
voltou a Paule e disse que não duvidava de seu amor... Implorou que se
retirasse, pois tinha compromissos marcados.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/08/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_11.html
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto