Desde 1903 muitos funcionários passaram pelas administrações do Colônia, além dos próprios diretores e médicos psiquiatras, havia o pessoal da limpeza e da cozinha, a gente da vigilância e os enfermeiros... Muitos deles tiveram de exercer funções extras e não poucas vezes incompatíveis com suas qualificações.
Os remanescentes se recordam das dificuldades que enfrentavam e do sofrimento dos pacientes... Em ocasiões de perturbação (da ordem), mesmo sem formação específica, qualquer podia um fazer a intervenção ministrando comprimidos ou injeções ao “paciente alterado”.
Um dos ex-funcionários foi entrevistado por Arbex e garantiu que nem sempre as medicações e os tratamentos de choque eram resultado de terapia... Ele lembra que se recorria a esses expedientes para conter atitudes rebeldes e intimidar os internos mais exaltados.
Os eletrochoques eram tão comuns no Colônia que muitas vezes “a energia elétrica da cidade não era suficiente para aguentar a carga”. É o que garante o médico psiquiatra Ronaldo Simões Coelho, que trabalhou no Colônia no começo da década de 1970.
(...)
Havia uma política de incentivo à ”evolução profissional”. Os
funcionários tinham chances de se mostrarem aptos às funções mais complexas no
tratamento dos pacientes. Eles deviam passar por avaliações práticas, como a
aplicação de injeções, definir os comprimidos adequados a cada caso, fazer
curativos e executar o eletrochoque.
Holocausto
Brasileiro
apresenta o depoimento de Francisca Moreira dos Reis... Ela começou a trabalhar
no Colônia em 1977. Depois de dois anos ela participou de um “treinamento-teste”
com outras vinte candidatas que disputavam o cargo de atendente de
enfermagem... O exame a que se submeteram consistia em aplicar o eletrochoque
em pacientes masculinos no Pavilhão Afonso Pena.
Francisca decidiu que verificaria o teste das demais colegas para ter
noção se conseguiria realizar a tarefa a contento... Ela conta que a primeira
candidata era uma das companheiras da cozinha, Maria do Carmo.
(...)
O relato nos dá uma ideia de como ocorria o procedimento.
Maria do Carmo cortou um pedaço de cobertor e o colocou na boca do
paciente, que estava amarrado à cama. A testa da “cobaia” foi umedecida...
Maria aguardou que um breve instante se passasse para encostar os eletrodos nas
têmporas do indivíduo. Isso foi feito sem nenhuma anestesia enquanto o aparelho
descarregava 110 e, depois, 120 volts.
(...)
Francisca conta que o paciente não resistiu aos choques e morreu ali
mesmo diante de todos... O tipo foi “embrulhado” num lençol e despachado para o
chão até que o levassem ao necrotério.
Mas os testes deviam
prosseguir.
Como se nada tivesse
ocorrido, solicitaram que a segunda candidata se aproximasse do leito de um
paciente mais jovem do que o primeiro... Também este infeliz teve o mesmo
destino do anterior. Ele também não suportou a descarga elétrica e morreu...
Francisca também não pôde suportar aquele ritual e retirou-se do
pavilhão gritando que não queria mais saber daquele curso.
(...)
A entrevistada conta
que preferiu continuar trabalhando na cozinha... Depois de algum tempo se
desligou do Colônia, e para lá retornou em 1988.
O seu caso é muito interessante, pois ela já conhecia o manicômio desde
a década de 1960... Aos dez anos de idade ela tinha acesso ao lugar para
entregar a marmita à mãe, Maria José Moreira, funcionária do Colônia desde
1959...
Retomaremos o assunto na próxima postagem.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/03/holocausto-brasileiro-genocidio-60-mil_20.html
Leia: Holocausto Brasileiro. Geração Editorial.
Um abraço,
Prof.Gilberto