Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/11/1984-de-george-orwell-tatica-da.html antes
de ler esta postagem:
Como vimos, os proletários constituíam uma
classe à parte... O Partido os mantinha na condição subalterna e sem qualquer
formação que lhes possibilitasse a autonomia. Não havia modo de os agentes de
repressão não reconhecerem os dotados de algum talento, que pudessem criar
situações indesejadas formando grupos descontentes com o sistema. Não demorava e
os enquadrava para tirá-los de circulação.
Evidentemente os proles não
eram aceitos no Partido, mas esse não era um princípio permanente ou
inquebrantável... Temos de reforçar a ideia de que o IngSoc não podia ser
confundido com uma classe na qual os direitos e privilégios são transmitidos de
pai para filhos. Seria o mesmo que imaginar que o poder extremado pudesse ser
transferido por herança. O que contava era a capacidade, e se ocorresse a impossibilidade
de manter os postos de comando ocupados por falta de gente competente, o
Partido saberia agir rapidamente e recrutar talentos observados no meio
proletário.
(...)
O fato de o Partido não ser uma instituição hereditária foi de extrema
importância para a neutralização da ação de opositores... No passado, os grupos
socialistas se preparavam para combater “privilégios de classe” na certeza de
que “o que não fosse hereditário não podia ser permanente”. Todavia não
aprofundavam a questão e não percebiam “que a continuidade de uma oligarquia
não precisa ser física”. Ao mesmo tempo não reconheceram que a duração das
aristocracias hereditárias não é das mais prolongadas. Não analisaram alguns
exemplos, como o da Igreja Católica que, passando por renovações e adequações,
se mantém por séculos.
Cedo o Partido percebeu
que, mais do que a herança, é “a persistência de certo ponto de vista em face
do mundo e de certa maneira de viver, imposta aos vivos pelos mortos” que conta
para a essência oligárquica. O que conta é o grupo dominante, e este só
mantém-se no poder enquanto faz os sucessores. Nesse sentido, não se busca a
perpetuação de sangue. Em vez disso, coloca-se em primazia a “perpetuação da
entidade” para que a estrutura hierárquica da sociedade permaneça... Em síntese,
pouco importa quem conduz o governo.
(...)
O Partido fez de tudo para
sustentar sua mística e usou todos os recursos para incutir nas mentes a sua
importância... As “crenças, gostos, emoções e atitudes mentais” foram
canalizadas para este fim. Desse modo as pessoas foram cada vez mais deixando
de se interessar pela “verdadeira natureza da sociedade”.
O quadro que se apresentava
indicava que a situação era de ampla estabilidade... Não havia a menor chance
de qualquer tentativa de rebelião avançar... Em relação aos proletários, o
“livro proibido” sentenciava que não possuíam qualquer organização e que, além
disso...
“Entregues a si mesmos, continuarão,
de geração em geração e de século a século, trabalhando, procriando e morrendo,
não apenas sem qualquer impulso de rebeldia, como sem capacidade de descobrir
que o mundo poderia ser diferente do que é”.
A situação se reverteria se houvesse significativo desenvolvimento da
indústria, pois isso obrigaria o regime a melhorar a formação dos operários...
Acontece que a tendência era bem outra, já que o padrão de “educação popular”
declinava na mesma medida em que “rivalidades comerciais e militares”
tornavam-se insignificantes. Assim, o Partido não tinha qualquer motivo para se
preocupar com o que o proletariado pensava ou deixava de pensar.
Para a classe dirigente prevalecia a máxima de que a massa de excluídos
sequer possuía intelecto e dessa maneira não tinha como reivindicar “liberdade
intelectual”. De modo diferente lidavam com os membros do Partido... Em relação
a esses era preciso muita atenção e não se permitia qualquer “desvio de opinião
a respeito do assunto menos importante”.
(...)
A Polícia do Pensamento jamais deixaria de
acompanhar de perto a vida dos membros do Partido... Isso era uma constante e
nenhum deles podia garantir que estivesse completamente só, pois a todo
instante (em isolamento, dormindo ou acordado, no trabalho ou no ócio, no banho
ou a fazer uma refeição) prevalecia a desconfiança de estarem sendo vigiados...
Não havia qualquer aviso ou elucidação de motivos, e dessa forma vivia-se sob a
sombra do patrulhamento.
A direção do Partido
obtinha todo tipo de informação a respeito dos membros... Nada lhe escapava!
“Suas
amizades, seus divertimentos, sua conduta em relação a esposa e aos filhos, a
expressão de seu rosto quando está só, as palavras que murmura no sono, e até
os movimentos característicos do seu corpo, é tudo ciosamente analisado”.
Utilizando
os mais modernos equipamentos de espionagem, a Polícia do Pensamento podia
descobrir qualquer tipo de infração e excentricidades... Uma simples mudança de
hábitos ou alteração de estado de espírito podiam ser indicadores de escrúpulos
indicadores de incertezas em relação à fé no regime.
Leia: “1984”. Companhia Editora Nacional.
Um
abraço,
Prof.Gilberto