sábado, 26 de julho de 2014

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – fim do capítulo VI; Nadine sai pilotando a motocicleta na perigosa estrada; depois da tempestade, a maior discussão do casal; rompimento?

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/07/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir.html antes de ler esta postagem:

Então é isso...
Lambert tentou demonstrar delicadeza no retorno de Nadine. Mas nada do que dissesse fazia com que a outra reconhecesse o seu esforço. Em vez disso, nota-se que ela fazia questão de agredir.
(...)
Anne retirou-se imaginando que mais aquela discussão prosseguiria durante toda a noite. Pela manhã dirigiu-se ao jardim e notou a grande quantidade de gravetos espalhados pela grama... Ela viu que a estrada estava bem danificada e enlameada. Apesar disso, a atmosfera estava bem agradável para o trabalho com seus papéis.
Nem bem organizou a mesa, ouviu o barulho da motocicleta conduzida por Nadine na esburacada estrada... A garota imprimia alta velocidade à máquina enquanto seus cabelos esvoaçavam e sua saia “subia-lhe pelas coxas nuas”...  É claro que ela não tinha a menor condição de ouvir os protestos gritados por Lambert.
Desolado, o rapaz dirigiu a palavra à Anne... Era com preocupação que afirmava que Nadine não sabia pilotar... Ela havia pegado a chave durante a noite... Certamente estouraria a cabeça contra alguma árvore tombada na estrada.
Anne quis acalmá-lo e disse que a filha tinha o seu modo específico de “ser prudente”... Ela mesma não sentiu firmeza nas próprias palavras... O moço concluiu que não tinha feito bem ao confiar tanto em Anne quando ouviu dela que Nadine o amava... Lambert viu que o seu esforço de reconciliação na noite anterior não havia produzido resultados positivos... Mais uma vez Anne aconselhou-o a ter paciência... Ele já não sabia o que fazer para que Nadine o aceitasse...
(...)
Lambert se retirou e Anne ficou a pensar sobre o novo transtorno... Imaginou Nadine tresloucada, em alta velocidade e se desviando de buracos e troncos que haviam caído durante a tempestade... Ela devia estar refletindo sobre a sua infelicidade por não ser amada por Lambert, pela morte de Diego... Mas e Lambert? Anne sentia que também para ele aquela situação não era fácil... Em seu quarto ele devia estar se deslocando de um lado para outro e pensando em sua condição de homem ao mesmo tempo em que ainda sentia falta da “ternura maternal”, proteção e exemplo dos adultos...
Anne preocupou-se com a situação temerária na qual Nadine se metera... Mas não havia como não pensar nas provações que os dois jovens teriam de superar para se estabelecerem como adultos... As moças eram oprimidas; os rapazes sofriam as mais diversas exigências do universo masculino... Inútil esperar que Nadine e Lambert se ajudassem para superar seus traumas.
(...)
O almoço foi tenso. Via-se que Lambert estava muito nervoso... Ao mesmo tempo temia o que pudesse ocorrer a Nadine... Anne disse que provavelmente a filha nem estivesse pensando que ele se preocupava... Talvez ela estivesse dormindo tranquilamente num campo ensolarado...
O rapaz era só lamentações... Não conseguia imaginar outra coisa além de um corpo estatelado num buraco qualquer da floresta... Lambert não parava de sentenciar que Nadine era uma louca por ter saído sem a sua permissão... Até Dubreuilh, que sempre se colocava à parte desses dramas, resolveu dizer que se algo tivesse ocorrido com a filha, alguém já teria telefonado.
Mais tarde o próprio Robert Dubreuilh cogitou ligar aos postos policiais da região... Mas isso não foi necessário porque o barulho do motor anunciou a chegada de Nadine... Lambert antecipou-se a todos e foi o primeiro a recepcioná-la quando ela saía da estrada.
Motocicleta e motociclista estavam completamente enlameadas... O sorriso cínico de Nadine foi interrompido por dois tapas de Lambert... O rapaz a agarrou pelos punhos... A moça gritava pela mãe enquanto sangrava pelo nariz... Anne sabia que a filha sabia como provocar sangramentos como aquele para se fazer de vítima, então disse que não tinham vergonha e exigiu que os dois se apartassem.
Lambert gritava que a partiria em pedaços... Nadine se mostrava indignada por ter apanhado por causa do brinquedo do outro... Anne explicou que nenhum dos dois estava com a razão... Em nenhum momento Nadine admitiu que alguém ali pudesse ter se preocupado com a sua segurança... Disparou que, para Lambert, tanto fazia se ela estourasse os miolos porque ele bem sabia o que era enterrar uma namorada... Sem saber o que dizer, o rapaz disse que ela havia traído Diego com todo o exército americano... Nadine lembrou que o pai dele havia entregado Rosa aos nazistas.
Depois de breve silêncio, Lambert proferiu que não queria mais vê-la... Subiu na moto e partiu... Nadine lançou-se na relva e gritou como uma louca.
Assim termina o capítulo VI de Os Mandarins.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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