sábado, 18 de setembro de 2010

Sobre "Noção de Coisas"

Conforme o prometido, segue um recorte de texto para prosseguir as reflexões propostas na publicação anterior. Se você não leu a publicação de 17 de setembro sugiro que o faça e, logo após, retome esta que eu entendo ser um complemento interessante.
Este texto foi escrito por Darcy Ribeiro, que foi um importante antropólogo de nosso país. Ele se engajou na política e foi senador da República pelo estado do Rio de Janeiro. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (9394/96) tem grande parte de seu conteúdo devida a ele.
Darcy Ribeiro escreveu textos muito importantes sobre a formação do povo brasileiro. Ele era particularmente apaixonado pelas nações indígenas.
O recorte foi selecionado de um livro chamado “Noção de Coisas”, que é voltado para o público adolescente. Para quem não sabe, há muitos anos havia uma disciplina nas escolas chamada “Noção de Coisas”, que tratava dar formação básica ao estudante em relação à vida em sociedade, à saúde e outras situações elementares.
Cheguei a este texto por indicação de minha esposa há muitos anos atrás, por volta de 1998. Consegui o texto na EMEF Teodomiro e não demorei a decidir pelo recorte aqui apresentado.
Indagar a realidade existente e propor soluções e alternativas para melhorar a vida dos seres humanos são tarefas dos cientistas? Em “Noção de Coisas” temos um divertido texto sobre o que eles podem produzir e já produziram, sejam conquistas e realizações benéficas para a humanidade, destruição da natureza e da vida... Ou maluquices inconcebíveis para a maioria das pessoas.
O Recorte de Darcy Ribeiro segue nas linhas a seguir. Boa leitura:

“A gente tem que confiar nos cientistas, porque não há outro jeito. Só com eles se pode conhecer a realidade do mundo para viver bem nele e para melhorar a vida. Mas é preciso ter cuidado. Algumas espécies de cientistas são muito nefastos para as pessoas que acreditam neles e os levam a sério.

Primeiro de tudo, os cientistas loucos, como o que inventou a dinamite e outros explosivos que modernizaram a guerra e a tornaram muito mais mortífera. Um deles se arrependeu tanto, que deixou toda a riqueza dele para criar e custear o Prêmio Nobel, que é a maior glória e a maior dinheirama que se dá a um cientista por suas descobertas. Outros doidos , reunidos em equipe, foram os que criaram as armas atômicas, que todo mundo sabe que pode acabar com a vida na Terra. Outros mais foram e são os que trabalham com a guerra biológica. Criam bombas de enfermidades, que, lançadas sobre um povo, provocam terríveis doenças incuráveis. Não há quem possa ir a uma guerra enfermo dessas doenças.
Pior, ainda, são os cientistas que inventam a tal guerra química. Esta fabrica bombas gasosas, que, soltas, em qualquer lugar, matam bichos e gentes de forma horrenda. Uns morrem de rir. Outros de chorar. Outros de desinteria e de outras formas ainda mais feias. ... Há, também, a chamada ciência-ficção, muito interessante da gente ler como entretenimento, mas que pode levar as pessoas à loucura, se tomarem aquelas histórias à sério. Elas tratam de impossíveis mundos futuros, que são prováveis. E com isso enredam histórias complicadas – algumas delas medonhentas.
Um deles escreveu uma história tão absurda, que tanto provoca riso, como revolta e irritação. A idéia dele é de que os homens e os bichos estão malfeitos porque, de fato, são sistemas muito imperfeitos de conversão. Só são capazes de converter aquilo que comem, coisas boas, em porcarias, excrementos. Ele teve a idéia de criar uma raça complementar, que, comendo nossos excrementos, produzisse coisas boas, como coca-cola e chocolate. Uma loucura! Só teria a vantagem de acabar com a carestia! Outro cientista, pior ainda, é o cientista-asno. Conheci um deles, cuja mania era pesquisar formas de tirar a humanidade da condição vivípara e elevá-la à condição de ovípara. Seu objetivo era livrar as mulheres dos nove meses de gravidez, tão incômodos, e das terríveis dores do parto. Em lugar de parir, elas botariam ovos, como as galinhas e outros bichos, como as cobras e os jacarés. Em tempo de crise, a gente comia os ovos. Em tempo de fartura a gente chocava. Na idéia dele, as mulheres botariam ovos compridos, como bananas e, para impor justiça neste mundo, os homens é que chocariam. Como você vê, isso é besteira. Uma loucura das mais rematadas. Não leve esse tipo de cientista à sério.”
Um abraço,
Prof.Gilberto
Leia: Noção de coisas. Editora FTD.

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