Havia cinco tipos de sentenciamentos à morte na França. Isso variava de acordo com a origem social do sentenciado e do tipo de crime cometido... Os nobres condenados eram encaminhados à decapitação; a forca era destinada aos “criminosos comuns”; os que cometiam o crime de “lèse-majesté” (contra o rei) eram arrastados e esquartejados; os condenados por “heresia, magia, incêndio criminoso, envenenamento, bestialidade e sodomia” eram destinados à morte na fogueira; assassinos e salteadores sofriam o suplício da roda.
Esquartejamento e morte na fogueira não eram punições frequentemente sentenciadas pelos juízes na França do século XVIII. O mais comum era o suplício da roda, como o aplicado a Jean Calas. Entre 1760 e 1762, na região de Aix-em-Provence, sul da França, boa parte das sentenças de morte (quase metade das 53 do período) foi por este suplício.
(...)
Essa época coincide com o crescimento das manifestações de
solicitações pelo fim da tortura e pela diminuição e moderação dos castigos aos
sentenciados. Pedia-se menos agressividade também nas punições aos escravos. Os
que se manifestavam admitiam a sensibilidade difundida pelo humanitarismo do movimento
Iluminista.
O livro cita frase de Samuel Romilly, reformador
inglês que em 1786 confirmava o anteriormente exposto:
“à medida que os homens
refletem e raciocinam sobre esse tema importante, as noções absurdas e bárbaras
de justiça que prevaleceram por eras têm sido demolidas, e têm sido adotados
princípios humanos e racionais em seu lugar”
(...)
O aristocrata italiano Cesare Beccaria, contava 24
anos quando em 1764 quando publicou “Dos delitos e das penas”. Essa obra foi
logo traduzida para o francês e o inglês, tendo se tornado referência para os
que participavam de círculos de discussões sobre os sistemas de justiça... Conta-se
que o grupo de estudo de Diderot debatia suas proposições, e que Voltaire o leu
avidamente na época em que ainda se debruçava sobre os desdobramentos do
sentenciamento imposto a Jean Calas.
A
obra visita os sistemas penais de vários países... O que mais chamava a atenção
em relação à explanação sobre o sistema jurídico criminal da Itália era que,
naquele país, a tortura, os castigos mais cruéis e até a pena de morte eram
rejeitados. Beccaria preconizava um padrão de justiça que pode ser entendido
como democrático: “a maior felicidade do maior número”. E isso em oposição ao “poder
absoluto dos governantes, a ortodoxia religiosa e os privilégios da nobreza”.
Não
demorou e essa ideia básica de Beccaria passou a ser defendida nas mais
diversas sociedades que passavam por processos de reformas do sistema penal. O
autor advertia que as condenações à morte provocavam mal maior à própria sociedade
pelo “exemplo de barbaridade” que proporcionavam. Em relação aos tormentos
cruéis aplicados durante as sessões de tortura, o autor dirigia críticas e ridicularizava
os que os ordenavam, chamando-os de instrumentos do “fanatismo furioso”.
Beccaria tinha consciência de que seus argumentos atacavam
estruturas poderosas há muito solidificadas. No entanto não deixava de
manifestar sua esperança:
“Se
eu contribuir para salvar da agonia da morte uma vítima infeliz da tirania, ou
da ignorância igualmente fatal, a sua benção e lágrimas de êxtase serão para
mim um consolo suficiente para o desprezo de toda humanidade”.
(...)
Como se afirmou, Beccaria influenciou muitos estudiosos,
pensadores e juristas. Um deles foi o inglês Willian Blackstone, que passou a
defender que a lei criminal não pode deixar de “se conformar aos ditados da
verdade e da justiça, aos sentimentos humanitários e aos direitos indeléveis da
humanidade”.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/10/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_22.html
Leia: A
Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto