quarta-feira, 2 de outubro de 2019

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – ideais iluministas para a educação das crianças; autonomia individual na base das organizações sociais e políticas; princípios defendidos por Rousseau e Kant; pequeno fragmento de “Pensamentos sobre a Educação”, de John Locke; Richard Price e a defesa da “liberdade física”; legislação para a autonomia na França Revolucionária

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/09/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_30.html antes de ler esta postagem:

A educação das crianças passou a ser vista com mais atenção, pois para os iluministas a formação para a autonomia havia se tornado mais significativa do que qualquer outra. Assim, “Emílio” (1762), de Rousseau tornou-se uma referência pedagógica na medida em que exortava a “independência” aos meninos.
Em seu “O que é o Iluminismo?”, Immanuel Kant explicou o movimento filosófico ao qual mencionava como “a humanidade saindo da imaturidade em que ela própria incorreu”... Ele esclareceu ainda que a imaturidade seria “a incapacidade de empregar a própria compreensão sem a orientação de outro”. Esperava-se que o indivíduo pudesse “pensar por si mesmo”.
Essa problematização em relação à “autonomia individual” ocorria na Inglaterra desde o século XVII. Hugo Grotius e John Locke pensavam a organização política da sociedade e argumentavam que a origem dos contratos estava na possibilidade de homens autônomos realizarem acordos uns com os outros. Isso fundamentaria e legitimaria a instituição da autoridade política... Bem diferente dos tempos passados em que o poder político se justificava “pelo direito divino, pela escritura e pela história”.
Ainda de acordo com o raciocínio, na medida em que se esperava que homens autônomos fossem a base dos governos legitimamente constituídos, a educação adequada aos meninos seria aquela que os levasse a pensarem “por si mesmos”.
(...)
Como podemos notar, Locke e Rousseau passaram a influenciar uma nova mentalidade em educação... Em vez da prática dos castigos para se obter a obediência (obviamente forçada), defendia-se o “cultivo da razão como principal movimento da independência”.
Em “Pensamentos sobre a Educação” (1693), John Locke apontava a relevância das práticas educacionais com foco na razão e autonomia:

                   “Devemos cuidar para que nossos filhos, quando crescidos, sejam como nós próprios (...) Preferimos ser considerados criaturas racionais e ter nossa liberdade; não gostamos de nos sentir constrangidos sob constantes repreensões e intimidações”.

A educação pensada por Locke incluía as meninas... Para ele, a formação das crianças e adolescentes deveria levá-las a uma autonomia que resultasse em nova relação com o mundo... Em outras palavras, a educação levaria os sujeitos a atitudes concretas e não apenas a formularem novas ideias.
Os jovens passariam a pensar e a decidir com independência... A mudança na forma de educar exigiria alterações psicológicas, políticas e filosóficas... Rousseau aconselhava as mães a ajudarem na construção de “paredes psicológicas” que protegessem seus filhos das “pressões sociais e políticas externas”. A alma das crianças devia ser protegida pela “cerca da autonomia”.
Também Richard Price, “pregador e panfletário político inglês”, em apoio aos revolucionários americanos de 1776, escreveu que a “liberdade física” era um dos quatro aspectos constituintes da liberdade... Especificamente este resultava em “espontaneidade ou autodeterminação” que faz do indivíduo um agente de transformação do mundo. Liberdade, então, seria o mesmo que “autodireção ou autogoverno”.
(...)
Os iluministas pretendiam mais do que “proteger o corpo ou cercar a alma”... Para eles, a maior importância estava no aumento das condições a que cada um pode chegar e tomar decisões por si.
Ao tempo da Revolução na França, algumas leis aprovadas indicam a tentativa de superar as limitações que tradicionalmente eram impostas à independência das pessoas. “A Invenção dos Direitos Humanos” esclarece que no ano de 1790 a Assembleia Nacional colocou fim à “primogenitura”, que definia direitos e garantias especiais ao primeiro filho da família... Além disso colocou-se fim às “letres de cachet”, que davam o direito às famílias de encarcerarem os filhos sem qualquer julgamento.
Durante o segundo semestre desse mesmo ano, os deputados da Assembleia puseram fim ao controle exclusivo que os pais exerciam sobre seus filhos ao estabelecerem Conselhos de Família com a função de mediar as disputas entre progenitores e filhos (de até vinte anos).
Logo outras leis foram aprovadas e assim a autonomia pessoal foi ampliada na França Revolucionária. O livro cita alguns exemplos:

                   * Abril de 1791 – Foi decretado que meninos e meninas passariam a ter os mesmos direitos de herança;
                   * Agosto/setembro de 1792 – A maioridade civil passou de 25 para 21 anos de idade. Uma vez atingida a idade adulta a autoridade paterna deixava de valer. Neste mesmo período os deputados aprovaram a lei de divórcio acessível tanto para os homens quanto para as mulheres “pelos mesmos motivos legais.

Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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