Sterne mereceu destaque em suas citações relacionadas à moralidade, mas Jefferson foi leitor também de Hutcheson e de Adam Smith... Por isso é praticamente certo que os temas da simpatia e da sensibilidade tenham sido objetos de suas reflexões.
“The power of Sympathy” é o título do primeiro romance (1789) escrito por um americano. Sem dúvida esse é um indicador do debate a respeito dessas faculdades. A literatura o reproduzia, e isso se repetia nas artes em geral e na medicina. Aconteceu mesmo que vários médicos começaram a alertar para os perigos que as pessoas corriam ao se dedicarem muito tempo à experiência da empatia... Para eles, isso provocava melancolia, hipocondria e “vapores”. Advertia-se sobretudo as “damas desocupadas”, pois elas passavam boa parte do tempo absorvidas pelas leituras.
(...)
Graças à simpatia e à sensibilidade (os franceses
preferiam este último termo), as sociedades revolucionárias experimentaram
mobilizações diversas a favor de vários grupos marginalizados e que não eram
“emancipados”... Apesar disso, a condição das mulheres parecia não despertar
nenhuma indignação.
Talvez inspirados pela metodologia empregadas nos
romances epistolares, os abolicionistas incentivavam os negros alforriados a
escreverem autobiografias em forma de romance. Essa iniciativa resultou em
aumento da quantidade de simpatizantes da causa da abolição. O livro cita a
produção literária de Olaudah Equiano, publicada em Londres no ano de 1789,
como uma obra impactante que exemplifica o anteriormente explicitado... O
título do livro de Equiano é “The Interesting Narrative of the Life of Olaudah
Equiano, Or Gustavus Vassa, The African – Written by Himself”.
Os
abolicionistas fundamentaram sua causa em narrativas como essa, mas nada que se
referisse à condição das mulheres sem direitos os levava a ampliar o seu leque
de reivindicações. Na França, da época logo após a publicação dos direitos
cidadãos, tornou-se comum a discussão e a defesa dos “direitos de protestantes,
judeus, negros livres e até escravos”... Mas essa atmosfera, em vez de
favorecer uma atenção maior aos direitos das mulheres, revelou-se ainda mais cruel
na medida em que os principais ativistas declaravam-se contra a concessão de
direitos a elas.
Não devemos imaginar que nos Estados Unidos a situação
fosse diferente. Pelo contrário! Enquanto a situação dos escravizados provocava
indignação e debates acalorados, a condição das mulheres chamava menos atenção
e provocava “ainda menos comentário público do que na França”. “A Invenção dos
Direitos Humanos” destaca que elas “não obtiveram direitos políticos iguais em
nenhum lugar antes do século XX”.
(...)
Durante
o século XVIII, as mulheres ainda eram vistas como criaturas dependentes, sem
qualquer capacidade de autonomia política. Na vida particular, entre os seus,
elas até podiam manifestar seu desejo por autodeterminação e por reconhecimento
moral, mas jamais evidenciar qualquer anseio por direitos políticos.
O
movimento e os documentos aprovados na França de 1789 resultaram em direitos às
mulheres, todavia eles não se relacionavam a qualquer equiparação ao status
político dos homens.
Emmanuel Joseph Sieyès, religioso católico eleito para a
Assembleia Constituinte na França revolucionária e autor de textos sobre teoria
constitucional, tratou de explicar a respeito das diferenças “entre os direitos
naturais e civis, de um lado, e os direitos políticos, de outro”.
De acordo com suas ideias, todos os que vivem em um país
(isso inclui as mulheres) têm os direitos de “cidadão passivo”: à proteção, à
propriedade e à liberdade. Mas nem todos são considerados “cidadãos ativos”.
Esses são os que podem “participar diretamente das atividades públicas”.
De acordo com Sieyès, eram cidadãos passivos: “As
mulheres, ao menos no presente estado, as crianças, os estrangeiros, aqueles
que não contribuem para manter a ordem pública”.
Podemos dizer que o fragmento apresentado permitiria
vislumbrar alterações futuras... É certo que muitos que ousaram antecipá-las
viram-se frustrados em suas tentativas.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/10/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_12.html
Leia: A
Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto