domingo, 6 de maio de 2018

“O Burrinho Pedrês” – conto de “Sagarana” – de João Guimarães Rosa – tudo alagado, o córrego da Fome transbordou; os vaqueiros esperam a chegada de Badú para saber da reação do burrico diante das águas; Francolim tenta se impor como autoridade, Silvino espera uma chance de atacar o inimigo, Badú se reconhece muito debilitado e o joão-corta-pau continua o piado sinistro

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2018/05/o-burrinho-pedres-conto-de-sagarana-de_6.html antes de ler esta postagem:

Finalmente alguém entendeu que o que estava assustando os cavalos não era nenhum pássaro... Eles estavam receosos do caminho por causa da enchente!
Os homens custaram a crer... Talvez o excesso de bebida alcoólica estivesse contribuindo para a confusão que faziam no caminho escuro. Mas estavam longe do leito do rio e por isso não entendiam como as águas pudessem chegar àquele ponto.
A chuva havia sido intensa... A verdade é que toda aquela região se tornou alagada e muito perigosa para os vaqueiros. Um deles observou que a friagem do local era “de beira de rio”. Os demais concordaram.
(...)
O córrego da Fome estava distante... Um dos homens concluiu que a baixada devia ter virado uma lagoa só... Leofredo disse que os cavalos só estavam “fazendo manha”.
Alheio aos problemas dos humanos, o pássaro continuou com seu canto sinistro “joão-corta-pau! joão-corta-pau!”
Leofredo sugeriu que os que estavam mais atrás dessem com as esporas nos animais para tirar-lhes a preguiça. Juca foi dos primeiros a aprovar a ideia, mas foi interrompido por Silvino, que deu a ideia de esperarem o Badú, que vinha mais atrás montado no burrico.
Um dos vaqueiros disse que “seria divertido”... Mas logo foi corrigido por outro que explicou que “burro não se mete em lugar de onde ele não consegue sair”... Dessa maneira, seria o Sete-de-Ouros que resolveria a situação: se ele entrasse na água todos o acompanhariam sem receios.
Finalmente os homens estavam chegando a um consenso... O que o burrinho fizesse todos fariam.
Mais uma vez ouviu-se o canto do joão-corta-pau no meio do mato.
(...)
Francolim deu o seu voto garantindo que estava na posição de quem tem “o dever da continência” por representar o patrão entre os homens.
Sinoca disse que o outro devia “tirar a colher do tacho”, pois a hora não era “para palhaçada”. Francolim respondeu que o Major devia ser respeitado, pois havia sido ele mesmo que o encarregara de “tomar conta e determinar” o que fosse necessário no retorno à Tampa.
Novamente houve protesto... Talvez tenha sido o próprio Sinoca a dizer que aquilo não passava de “bestagem”.
Mais uma vez ouviu-se o canto do joão-corta-pau no meio do mato.
(...)
Depois de algum tempo os homens notaram a chegada de Badú...
Passaram a gritar para ele se apressar. O rapaz continuava muito embriagado, mas parece ter despertado ao notar os companheiros mais à frente e disse que estava a caminho... Tratou-os por “meus parentes” e brincou ao se referir a eles como “injúrias-peladas de vaqueiros sem boi nenhum”.
Mas ele cuidou de abraçar com firmeza e ternura o pescoço do burrico.
Enquanto chegavam vagarosamente, Badú conversou com o Sete-de-Ouros... Ao pé do ouvido do burrinho, disse: “Eh, meu velho, coitado, que trapalhada! Estou doente, dei na fraqueza, com este miolo meu zanzando, descolado da cabeça... Muito doente... Estou com medo de morrer hoje... Mas, se você fosse mais leve, compadre, eu era capaz de te carregar!”
(...)
Os homens comentaram que Badú estava chegando “bêbado como gambá”.
Mesmo na escuridão, Francolim percebeu que Silvino se aproximou de seu desafeto... O advertiu e disse que não consentia a aproximação. Reclamou que os dois estavam brigados e não era direito chegar no adversário que estava caindo de bêbado.
Silvino reclamou... Gritou que Francolim devia calar a boca... Xingou-o e avisou que ele devia deixá-lo, pois ia aonde bem queria.
Francolim redarguiu que não adiantava o rapaz bufar porque suas palavras eram “de paz” e, além disso, estava “na lei” em nome do patrão.
Mais uma vez ouviu-se o canto do joão-corta-pau no meio do mato.
Leia: O Burrinho Pedrês – conto de Sagarana. Editora José Olympio.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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