domingo, 20 de maio de 2018

“Mayombe”, de Pepetela – o Comando decidiu a respeito da continuidade de Teoria na missão; Sem Medo e sua síntese sobre a tarefa do Comissário Político na guerrilha

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2018/05/mayombe-de-pepetela-teoria-defendeu-sua.html antes de ler esta postagem:

O Comissário não entendeu qual era a “possibilidade” a que o Comandante se referia. Sem medo disse que ele mesmo não sabia dizer... Quem sabia? Só mesmo o guerrilheiro Teoria, mas certamente ele não tinha a menor intenção de falar. E, neste ponto, como não concordar?
Para o camarada havia “duas hipóteses: ir ou não ir”... Ele escolhera continuar com o grupo... O Comandante ressaltou que talvez a escolha tivesse sido feita sem a necessária reflexão. Mas o que podiam fazer? Destacou que Teoria era homem honrado e certamente não voltaria atrás em sua decisão. Se fora teimoso ou não, também isso só ele podia responder.
Para Sem Medo estava resolvido... Além do mais sabia que os teimosos normalmente se mantêm em sua teimosia até o fim. E o fato de haver risco em suas decisões parece reforçá-los.
(...)
Neste ponto da discussão, o Comissário disse que as palavras do Comandante combinavam com “liberalismo”.
A reação do Sem Medo foi dizer que o outro não demorava a colocar “palavrões” na conversa. Sem levar em consideração que a observação pudesse ou não ter sido ofensiva, o Comandante disse que podia ser que o que havia dito tivesse algo de liberalismo, todavia ele mesmo não tinha o papel de “comissário político”. Acrescentou que, no grupo, era o Comissário Político que devia politizar os guerrilheiros e “defender a posição política justa”, funcionando como uma espécie de “anjo-da-guarda”.
O Comissário apenas sorriu... O Comandante contava dez anos a mais do que ele e naquele momento parecia-se com o adolescente que procura se safar de discussões mais sérias.
Não foi por acaso que ele voltou-se ao Chefe de Operações para perguntar o que ele pensava a respeito da situação do Teoria. Ainda distraído, o homem disse que pensava que o Comandante estava com a razão.
O Comissário entendeu que havia perdido na “votação”. Disse que a partir daquele instante o Comandante era o responsável pelas consequências provocadas pelo prosseguimento do guerrilheiro lesionado na missão.
O Comandante respondeu que a responsabilidade a mais em nada alterava o seu compromisso com o movimento de libertação. Teoria intrometeu-se a dizer que nada de mal ocorreria. Mas não se pode garantir que ele mesmo tivesse refletido sobre como seu joelho se comportaria na retomada da caminhada.
Certamente a decisão do Comando lhe proporcionara um “contentamento dúbio”.
(...)
A reunião terminou...
Cada um dos homens se retirou para o breve cochilo.
Quando despertaram, uma leve chuva caía sobre a floresta. Lá em baixo os guerrilheiros estavam protegidos pelas vastas copas das árvores. Só depois que o chuvisco parou é que a água acumulada nas folhas começou a gotejar. É como o texto afirma: “Tal é o Mayombe, que pode retardar a vontade da natureza”.
Certamente o professor havia sido o que menos dormira... Sua perna estava muito dolorida. Afinal, por que fizera tanta questão de prosseguir na ação? Ele sabia que em nada acrescentaria. Sequer era guerrilheiro excepcional!
Sua condição de “professor da Base” o liberava de certas tarefas, como a de “fazer guarda”... Ele mesmo insistira com o Comando o ser obrigado a cumprir como os demais guerrilheiros.
O rapaz era mestiço... Nenhum dos homens parecia se importar com isso. Como vimos, ele guardava o segredo de seu drama.
O Comissário não relacionou nenhum “desvio psicológico” à insistência de Teoria em manter-se na missão. O Chefe de Operações não demonstrou o menor interesse pelo caso. O Comandante, que era entre todos o “veterano” nos combates, “adivinhou” que havia mais do que abnegação nos propósitos do professor guerrilheiro.
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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