quinta-feira, 31 de maio de 2018

“Mayombe”, de Pepetela – não há militares entre os trabalhadores nativos; discussão sobre a possibilidade e inconveniência do contato com os civis; Chefe de Operações e Comissário Político debatem sobre a ação mais pragmática

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2018/05/mayombe-de-pepetela-o-zumbido-da-serra.html antes de ler esta postagem:

O Chefe de Operações retornou trazendo as informações recolhidas pelo seu grupo, que havia tomado o caminho da direita...Viram seis trabalhadores, mas nenhum soldado.
Os homens avistados pelo grupo do Chefe de Operações lidavam com machados. A serra em operação estava do outro lado, onde haviam feito uma picada para a retirada da madeira.
Enquanto ouvia, o Comandante ia definindo a ação... O Chefe de Operações acrescentou que, em sua opinião, deviam vigiar Lutamos. Salientou que não tinha acreditado em sua “distração” e que o moço devia estar mais interessado em avisar os trabalhadores para que se dispersassem.
E as suspeitas sobre Lutamos não paravam por aí... O oficial prosseguiu dizendo que achava o comportamento do rapaz muito estranho e que, além disso, tinha um olhar “nada bom”... O problema, de acordo com o Chefe de Operações, era que o Comissário não entendia daquelas coisas e foi por isso que acreditou na primeira lorota que ouviu. O mais correto seria fazer um interrogatório!
O Comandante não respondeu... Tinha vontade de fumar, mas sabia que a ocasião era imprópria.
(...)
Depois o Comissário chegou com o seu pessoal... O Comandante levantou-se esperando terminar suas conclusões a respeito das posições inimigas.
O homem explicou que tinham visto oito trabalhadores e mais um tipo branco que era o responsável pelo caminhão. Seu grupo também não tinha avistado nenhum soldado na área.
O Comissário chamou de “nguêta” o tipo branco. Disse que ele mantinha o caminhão parado e que estava acomodado a ouvir rádio. Era de se esperar que junto ao caminhão houvesse um buldôzer (trator) utilizado para transferir os troncos à carroceria do caminhão.
O Comandante pediu para o Chefe de Operações se aproximar... Perguntou-lhe o que pensava sobre os procedimentos que deviam adotar. Este respondeu que o mais correto seria fazerem uma curva para alcançarem a picada mais adiante e, a partir dela, a estrada. Sua proposta era a de seguirem adiante.
Sem Medo quis ouvir também o Comissário Político... Este disse que deviam aproveitar a ocasião, capturariam os trabalhadores e tomariam a serra... Podiam destruir o trator e o caminhão.
O Comissário emendou que o que dissera correspondia exatamente ao propósito inicial do grupamento e que não havia motivo para mudar.
No mesmo instante o Chefe de Operações se intrometeu dizendo que eram militares e que a primeira ação na área tinha de ser militar. Voltou a insistir que deviam seguir pela picada e tomar a estrada. Em algum ponto armariam uma emboscada às tropas dos tugas.
(...)
A questão era se deviam ou não contatar os trabalhadores da extração da madeira. Para o Chefe de Operações, não havia o menor sentido ou interesse... Ressaltou que seria diferente se estivessem dispostos a fuzilá-los. Mas não era esse o caso.
O Comissário pretendia politizá-los... Mas o Chefe de Operações não acreditava que essa iniciativa resultasse em razoável, e insistiu que a guerra era o bastante para politizar.
(...)
O Comandante ouviu os dois camaradas...
Depois dirigiu-se ao Comissário dizendo que a “operação política e econômica” tinha o seu interesse. Mas lembrou que a ação naquele local comprometeria qualquer futura ação militar. Evidentemente os inimigos tomariam conhecimento da destruição de suas máquinas e isso os deixaria alertas a respeito da presença guerrilheira no Mayombe.
O Comissário respondeu que o ataque às máquinas levaria os tugas à estrada. Fariam patrulhas e isso possibilitaria o confronto. Tudo indicava que, se nada ocorresse, os inimigos se manteriam na vigilância da população local para impedir o contato entre rebeldes e nativos.
O raciocínio contrário aos argumentos do Comissário diziam respeito à atenção dos tugas que, sabendo que estavam nas imediações, não vacilariam no primeiro encontro que tivessem...
O Comissário argumentou que a guerra popular não se auferia levando-se em conta apenas o números de inimigos abatidos... O apoio popular contava muito, e era isso o que podiam começar a construir ali mesmo.
O Chefe de Operações argumentou que o apoio popular ocorria com a ação das armas. O Comissário redarguiu garantindo que também a politização dos locais era importante para que os objetivos da guerrilha fossem alcançados.
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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