segunda-feira, 2 de abril de 2018

“O Burrinho Pedrês” – conto de “Sagarana” – de João Guimarães Rosa – fazendo a conta das montarias disponíveis; Major Saulo e sua irritação com os vaqueiros; a má sorte do Sete-de-Ouros; o café de Maria Camélia e o gracejo sobre João Manico ter de montar o velho burro

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2018/04/o-burrinho-pedres-conto-de-sagarana-de.html antes de ler esta postagem:

Cabisbaixo, Francolim havia listado os animais com os quais podiam contar para o serviço do dia e acrescentou que o grupo era suficiente. Mas no mesmo instante o patrão o advertiu... Será que ele andava “analfabeto”? Precisava pensar um pouco mais...
Então o moço se lembrou do cavalo preparado “de silhão” (sela grande e adaptada para as mulheres e seus trajes longos) que era utilizado por dona Cota (Maricota)... Além desse havia o jovem poldro, mas salientou que este ainda não estava domado.
O Major Saulo foi incisivo ao garantir que também o poldro faria parte da expedição... Francolim admitiu que, se era assim, tinham todas as montarias necessárias.
O patrão pediu que ele contasse nos dedos, pois, além deles dois, seriam necessários mais dez.
Depois de fazer os cálculos, o rapaz concluiu que estava faltando um cavalo.
Então o patrão respondeu que Francolim acertara “depressa demais”.
(...)
O Major Saulo dirigiu-se à porta e olhou para os ponteiros do relógio da parede da sala...
Neste mesmo momento, Maria Camélia apareceu trazendo cafeteira e caneca... O patrão quis saber se a bebida estava bem quente, do jeito que os mais velhos apreciam... Ela confirmou que estava “de pelar”. Então o Major Saulo sorveu um bom gole, alisou a barriga e deixou escapar o sorriso “calibrado ao seu humor de momento”.
A negra Maria e o Francolim também sorriram, mas logo se sentiram incomodados e voltaram a silenciar. O patrão ordenou que ela entregasse o resto do café ao peão, porém acrescentou que não devia soprar, pois não era para arrefecer a bebida.
(...)
O patrão levou um cigarro à boca e posicionou-se no parapeito da varanda... Olhou na direção dos currais e pronunciou o que estava pensando naquele momento... Era “gado para encher dois trens”! E ainda havia as vacas que ficariam no arraial. O momento não era apropriado para a retirada porque a chuvarada estava para cair. Por outro lado reconhecia que era melhor que chovesse logo, pois depois viria uma estiagem para dar-lhes folga no percurso.
O Major estava mergulhado em suas reflexões quando notou que o burrinho se acomodara nos pilares que sustentavam a varanda. O homem sorriu, referiu-se ao Sete-de-Ouros como se estivesse lidando com um de seus compadres e disse que, mesmo velho, ele ainda podia aguentar uma viagem “vez em quando”.
Na sequência disse que o Francolim devia colocar arreios também no burro.
O rapaz disse um “sim senhor”, mas quis saber se o patrão estava falando sério ou se estava a gozar do pobre animal... O Major deu a entender que não estava para brincadeiras e soltou sua risada característica.
Sete-de-Ouros cerrou os olhos... Decerto o desgosto tomou conta de seu ser.
(...)
Francolim argumentou que o burrinho estava “pisado” e sequer enxergava direito... O patrão discordou e parou para pensar enquanto remexia o dedo no nariz... Por fim pronunciou que eram apenas quatro léguas... O burro podia carregar o mais leve dos homens, que era o João Manico.
Depois o patrão deu-se por satisfeito com as próprias conclusões e sorriu mais uma vez... Então deu ordem para que o Francolim se retirasse para que não perdesse mais tempo.
(...)
Maria Camélia também retirou-se no mesmo instante para a cozinha, onde já chegou contando as novidades às companheiras de labuta (“três meninas, quatro moças e duas velhas”)... Os cachorros e gatos que frequentavam o local entravam e saíam, mas as mulheres só tinham assunto para o disparate... Riam também ao imaginarem o João Manico tocando a boiada montado no burrinho... Mas não era uma graça?
Leia: O Burrinho Pedrês – conto de Sagarana. Editora José Olympio.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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