O modo como Phileas Fogg se manifestara a respeito de sua certeza em relação ao embarque foi tão incisivo que Passepartout afirmou que era mais que certo que antes da partida do navio estariam a bordo. Não ousou nenhum questionamento, mas de fato não estava inteiramente convencido.
Sua preocupação aumentou no instante em que o policial voltou a abrir a porta às oito e meia. Os três detidos foram levados para uma sala de audiência. O francês notou que o auditório estava bem concorrido. Europeus e nativos lotavam o cômodo.
Fogg, seu criado e a senhorita Aouda foram acomodados em três cadeiras posicionadas diante de uma grande mesa onde se colocariam o magistrado e o escrivão.
(...)
A sessão começou um tanto atrapalhada.
O juiz Obadiah era um tipo alto e rechonchudo. Antes de dar início ao
interrogatório colocou a tradicional peruca, mas logo que começou a falar sobre
o caso notou que havia cometido um erro em relação ao adereço, e foi por isso
que chamou a atenção de Oysterpuf (o escrivão).
A peruca na cabeça do magistrado era a de Oysterpuf.
Ele fez a observação e o meritíssimo salientou que para proferir uma “boa
sentença” devia usar a “peruca correta”.
Oysterpuf interrogou como quem faz uma chamada. Phileas Fogg respondeu
que estava à disposição. Passepartout disse que estava presente.
Na sequência o juiz explicou que fazia dois dias que os dois eram
procurados e que todos os trens de Bombaim haviam sido investigados.
Passepartout quis saber de que estavam sendo acusados. O juiz Obadiah
respondeu que logo ele saberia. Ao ouvi-lo, Phileas Fogg manifestou que, sendo
cidadão inglês, tinha direito.
Aconteceu que ele não pôde terminar o que dizia porque o juiz o
interrompeu perguntando se alguém o desrespeitara. Fogg respondeu que não, de
modo algum. Então o juiz não viu motivo para interromper o interrogatório e
pediu para que trouxessem os que tinham apresentado queixa.
(...)
Três sacerdotes indianos
foram trazidos à sala.
No mesmo momento
Passepartou concluiu que aqueles eram os que pretendiam sacrificar a jovem
Aouda no ritual “sutty”.
Os religiosos
mantiveram-se firmes diante do juiz enquanto que o escrivão fez a leitura da
acusação de sacrilégio. Acusavam o senhor Fogg e o criado de terem “violado um
lugar consagrado à religião bramânica”.
O juiz Obadiah quis saber se Phileas Fogg tinha ouvido a acusação. Ele
respondeu que sim e olhou para o relógio. Logo a seguir disse que confessava.
Era isso mesmo? O juiz
pediu para ele confirmar o que acabara de dizer. Fogg respondeu afirmativamente
e disse que esperava que os três sacerdotes também confessassem a respeito de
suas intenções no templo de Pillaji.
Os homens não entenderam o que ele estava querendo
dizer e olharam uns para os outros com ares de interrogação. Estava claro que
não compreendiam e, para complicar ainda mais, no mesmo instante Passepartout
começou a dizer que no referido templo eles se reuniram para sacrificar uma
vítima.
Os três se espantaram ainda mais. O juiz Obadiah estranhou, quis saber
mais e perguntou sobre quem era a vítima. Em plena Bombaim?
Passepartout percebeu que havia uma confusão na troca
de acusações. O escrivão explicou que os acusadores tinham queixas a respeito
de uma confusão no templo de Malebar Hill. Na sequência ele colocou a prova do
delito sobre a mesa.
O francês reconheceu seu par de sapatos no mesmo instante. Não conseguiu
segurar a exclamação. Ele e Fogg trocaram olhares e sem que precisassem falar entenderam
que aqueles três sacerdotes o haviam perseguido pelas ruas de Bombaim. É claro
que eles tinham se esquecido do episódio.
(...)
Sabemos o que ocorreu.
Fix, o investigador que esperava um mandato de prisão desde Londres para
capturar Phileas Fogg, resolveu não partir no trem para Calcutá porque soubera
da confusão em que Passepartout se metera no templo em Bombaim.
Aproximou-se dos religiosos e os aconselhou a abrir um processo judicial.
Garantiu que obteriam indenizações satisfatórias.
Por conta de sua artimanha,
Fix perdeu umas doze horas. É verdade que ele e os três brâmanes conseguiram
passagens para o próximo trem. Fogg seria alcançado, mas como sabemos ele e os
companheiros resolveram resgatar a jovem Aouda.
Isso explica por que Fix chegou à capital antes
de seu suspeito.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/04/a-volta-ao-mundo-em-oitenta-dias-de_13.html
Leia: A
Volta ao Mundo em Oitenta Dias – Coleção “Eu Leio”. Editora Ática.
Um abraço,
Prof.Gilberto