sábado, 31 de janeiro de 2015

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – de delírios, raciocínios esquizofrênicos e conclusões equivocadas; Anne consegue encaminhar Paule ao doutor Mardrus

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/01/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir-de_28.html antes de ler esta postagem:

Há quem pense que situações como a exemplificada em Os Mandarins sejam remotas, que jamais viverão ou serão vivenciadas por aqueles que lhe são próximos.
Depois da calmaria sempre pode ocorrer uma catástrofe... E nem sempre a fortuna nos agracia mantendo-nos distantes das avarias...
O que dizer sobre o lamentável encontro de Anne com Paule? Ficou claro que Paule precisava de tratamento psiquiátrico...
(...)
Você pode dizer que as alterações na vida da moça foram intensas e que ela estava despreparada para os tropeços...
Mas quem poderá garantir que esteja qualificado para encarar os “percalços existenciais”?
(...)
Na tarde seguinte, os Dubreuilh tomavam café quando Claudie chegou preocupada com Paule. Disse que almoçariam juntas, mas a garota não apareceu... Claudie disse que, ao telefonar para o estúdio, foi atendida por uma Paule que ria histericamente ao mesmo tempo em que gritava “sentem-se à mesa”, como se estivesse louca...
Anne decidiu conferir a situação... Claudie quis colaborar de alguma forma e ofereceu carona, então as duas seguiram para o estúdio.
(...)
Paule apenas entreabriu a porta... Dispensou-as dizendo que não precisava da ajuda de ninguém... Na sequência, trancou a porta com extrema violência e gritou ofensas (chamou de “comédia” a intromissão das duas).
Anne notou o seu semblante cansado e um chale violeta cobrindo a sua cabeça.
Tiveram de se retirar dali... Na calçada, Claudie sentenciou que num caso como aquele se fazia necessário comunicar alguém da família (Paule tinha uma irmã)... Anne concordou, mas insistiu em ver Paule e convencê-la a descansar.
Em conversa com a zeladora, ficou sabendo que a situação era mais grave do que se podia imaginar... Fazia cinco dias que Paule não comia nada... Os moradores dos apartamentos de baixo estavam protestando da intensa movimentação e barulho provenientes do apartamento dela.
Anne e Claudie se dirigiram novamente ao apartamento... Dessa vez havia uma folha datilografada com um “aviso” (o “macaco mundano”) colada na porta... Não adiantou baterem ou Anne ameaçar derrubar a porta... Pela fechadura pôde ver que a outra estava ajoelhada diante da lareira, onde atirava grandes volumes de papéis.
Mas Paule acabou abrindo a porta para confirmar que não queria auxílio de nenhuma forma... A moça chorava copiosamente e tinha o nariz escorrendo... Estava um verdadeiro trapo... Aliás, além de manuscritos e cartas, atirava roupas ao fogo da lareira.
Com muita paciência e educação, Anne tentou dissuadi-la... Disse que seu estado era dos mais graves e que precisava de ajuda... Mas Paule começou a urrar e a expulsá-las do estúdio... Berrava a certeza de que era odiada por todos e dirigia palavras de ódio a Anne e Claudie.
(...)
Não havia como intervir... As duas se retiraram... Claudie telegrafou para a irmã de Paule... Anne encaminhou um recado a Henri.
(...)
À noite apareceu um rapaz com um bilhete para Anne... O tipo era sobrinho da zeladora do prédio onde Paule morava... O rabisco implorava que Anne a visitasse imediatamente, pois ela não lhe tinha ódio.
Nadine se irritou e quis impedir que a mãe fosse até a casa de Paule... Além de não resolver nada, era muito arriscado... Mas Anne insistiu que iria, então a moça decidiu que não a deixaria ir sozinha.
Robert concordou com Nadine e resolveu que ele mesmo devia acompanhar Anne.
(...)
Paule estava em frangalhos e seu aspecto era dos mais deprimentes... Mas não ofereceu resistência... Solicitou que os Dubreuilh entrassem.
Os espelhos estavam quebrados e sobre os tapetes jaziam estilhaços... A atmosfera estava pesada devido à grande quantidade de papéis e também de tecidos que ela atirou à lareira...
Paule acomodou os Dubreuilh como foi possível... Depois passou a agradecer-lhes... Enfim entendia que tudo o que havia sofrido não era sem uma razão... Perguntou, como que a querer conferir sua conclusão, se tinha ou não razão.
É claro que a moça “variava” das ideias, Anne disse que não havia nada a ser agradecido, todavia (para não torná-la ainda mais indisposta) respondeu que todos agiram para ajudá-la...
Na sequência, Paule quis um conselho: devia ingerir ácido prússico (cianureto de hidrogênio)? Robert interveio imediatamente e disse que não permitiria que ela tomasse o veneno...
Paule quis saber como se redimiria se não pretendia mais ocupar-se de si mesma... Anne disse que ela precisava repousar... Ao mesmo tempo ficou intrigada com a possibilidade de haver mesmo alguma quantidade do ácido em sua bolsa.
Então, se não devia se suicidar, Paule começou a imaginar o que poderia fazer de sua vida... Disse que pretendia trabalhar para pagar o que devia a Henri, pois assim ninguém mais a insultaria... Poderia trabalhar como doméstica?
Robert pediu que não se preocupasse porque poderiam arranjar-lhe uma ocupação.
(...)
Ela se lembrou de que havia queimado vestidos e outras peças... No mesmo instante se mostrou incomodada... Teria esse direito? As roupas podiam ser vendidas ou distribuídas... Por que não doá-las aos necessitados naquele mesmo instante?
Ao colocar um casaco sobre os ombros para encaminhar-se à rua, Paule parou repentinamente e assumiu que aquele comportamento era uma “comédia”... Então levou as mãos aos olhos sem conseguir conter as lágrimas e concordou que estava muito doente. Pediu que tratassem dela.
Anne dissolveu um comprimido num copo d’água e entregou-lhe garantindo que se sentiria melhor... Ela ingeriu o remédio e aceitou deitar-se.
(...)
Anne verificou a bolsa de Paule e constatou que havia mesmo um frasco com o veneno... Obviamente escondeu-o no seu bolso.
No dia seguinte ela a encaminhou ao doutor Mardrus.
O especialista disse que Paule seria curada...
Anne pensou sobre o tipo de mulher que resultaria do tratamento... Certamente uma como as demais, “que não sabe por que vive”.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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