Os jovens liderados por Chato Peredo saíram da capital com a esperança de que fariam história... Sentiam-se como se estivessem vingando a morte do Che... Acreditavam mesmo que podiam concluir a luta revolucionária que ele semeara na América do Sul.
Mas as condições que passaram a enfrentar, tão logo realizaram a ação contra a South American Placers, indicavam que o exército boliviano não lhes daria nenhuma condição de escapar impunes da selva...
Os militares bolivianos recebiam treinamentos de tropas enviadas pela CIA há algum tempo e esbanjavam confiança nas operações para as quais haviam sido destinados.
As estradas e até os menores povoados estavam ocupados por esses militares.
A luta pela sobrevivência seria das mais dramáticas.
É o relato de Guillermo Veliz que fornece as informações que Kapuscinski transcreveu e que seguem sintetizadas na sequência.
(...)
Os rapazes conheciam as orientações do Che a respeito da luta
revolucionária no interior do país... Era fundamental que os guerrilheiros
obtivessem o apoio dos camponeses... Mas a região era praticamente despovoada
e, além disso, a ocupação militar tornava impraticável qualquer tática.
Não demorou e eles perceberam que havia outras adversidades que não
esperavam enfrentar... A selva era ambiente que não conheciam e não tinham a
menor ideia de como sobreviver aos “perigos naturais”...
Logo viram que não seria fácil encontrar água... Além disso,
reconheceram que as mais singelas resinas que se desprendiam de troncos
inofensivos podiam ser mais agressivas que a soda cáustica... Uma simples gota
era capaz de “atravessar o crânio e perfurar o cérebro”...
Corria-se o risco de ficar cego por causa de “vespas selvagens” que
infestavam o local... E o que dizer das diversas cobras venenosas que podiam
surpreendê-los a qualquer instante? A pior de todas era a coralito, e sobre ela
dizia-se que sua picada podia transformar em água o sangue da vítima.
(...)
Veliz apresenta um quadro
completamente desfavorável a respeito da selva boliviana...
E a caminhada era
incessante...
Durante o dia não havia
possibilidade de sentarem por causa das formigas... À noite eram atacados por
mosquitos... Como se vê, tudo isso contribuía para que o moral dos subversivos
diminuísse a cada passo que davam.
A situação de quem
queria escapar da perseguição dos militares só podia ser insustentável...
Mas os rapazes entendiam que não podiam medir esforços, já que não
planejavam se instalar em nenhuma daquelas paragens inóspitas.
(...)
O próprio governo mantinha
campos ilegais de detenção para prisioneiros políticos na área... Esses campos
não possuíam cercas ou muros simplesmente porque a fuga era impossível...
Selva fechada e pântanos...
Não havia confrontos entre guardas e presos, até
porque todos ali se sentiam detidos... Viviam isolados do mundo, e só mesmo
quando o avião militar aterrissava lembravam que pertenciam a um país cujas
instituições legitimavam aquela amarga existência.
Os campos secretos podiam enfrentar ainda mais problemas. Sobretudo
quando governos caíam (isso era uma constante) e os novos mandatários sequer
tinham conhecimento das “instalações ilegais”... Nessas ocasiões acontecia de,
tantos os detidos como os responsáveis pelos campos, passarem necessidades e
morrerem de fome.
A desgraça os unia... E é por isso que
sequestravam o avião para escapar daquele inferno.
Leia: A
Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto