O texto que segue tem como referência a leitura
do periódico Novos Estudos Cebrap,
vol. 1 Nº 2 Abril de 1982. Naquela edição, os estudos coordenados por Roberto
Schwarz tinham como “tema gerador” Os
pobres na Literatura Brasileira. A referência aqui é o texto de Laura
Vergueiro, Os vadios do século XVIII.
Memórias, Crônicas e
Instruções redigidas durante o século XVIII registraram juízos e determinaram
regras que faziam referências à condição de vida dos pobres que habitavam o
Brasil colonial, todavia essa literatura foi pouco utilizada pela historiografia.
Em seu texto, Vergueiro não tratou das implicações ideológicas
decorrentes da omissão dos pesquisadores e das “grandes explicações do Brasil”
em relação aos menos favorecidos... Seu texto traz reflexões sobre os escritos
de Antonil e Teixeira Coelho, nos quais os “pobres da colônia” estão
focalizados.
José João Teixeira Coelho,
alto funcionário e magistrado na região das minas de ouro, escreveu Instrução para o Governo da Capitania de
Minas Gerais (1780). Sobre o seu conteúdo trataremos nas próximas
postagens.
Cultura e Opulência do Brasil por suas drogas e minas, obra de Antonil publicada em 1711, foi confiscada
pelas autoridades da metrópole e quase totalmente destruída. Essa perseguição
devia-se ao conteúdo repleto de detalhes sobre as riquezas coloniais, algo que
Portugal não tinha o menor interesse de difundir. Vergueiro destaca este fato e
ressalta a importância de alguns exemplares terem sido preservados (a obra foi
reeditada em 1837, no Rio de Janeiro).
Por “pobres da colônia”
devemos entender pessoas livres, porém desvinculadas dos mecanismos
produtivos... Homens desfavorecidos que, por sua condição e modos de proceder
no cotidiano, eram comumente tratados por vadios.
Em trecho de Antonil,
citado por Vergueiro, lê-se que:
Para vadios, tenha enxada e foices, e se quiserem
deter no engenho, mande-lhes dizer pelo feitor que trabalhando, lhes pagarão
seu jornal. E, desta sorte, ou seguirão seu caminho, ou de vadios se farão
jornaleiros.
Eram vadios por estarem
completamente apartados dos mecanismos que caracterizavam a produção colonial...
O trecho destaca que havia a opção de se engajarem no engenho, onde “deixariam
de ser vadios”... Enxadas e foices eram a sua redenção... Trabalhando,
receberiam... Caso pretendessem “seguir o seu caminho”, voltariam à vadiagem.
Antonil deixa claro,
ainda, a oposição que podia se verificar na sociedade de então: a parte sã constituía-se
dos que trabalhavam, produziam valores e riqueza; a “parte corrompida” (nula
economicamente) era formada pelos desocupados, os vadios.
O jesuíta italiano destaca
que a “fama das minas de ouro” atraiu todo tipo de gente. Parte dos que para lá
seguiram mereceram o destaque de Antonil... Segundo ele mesmo, eram pessoas de
cabedal... Mas ele lamentava que também os vadios tivessem visto nas minas
possibilidades de enriquecimento... O autor esclarece que enquanto as pessoas
de bem se ocuparam nas atividades que dignificam a condição humana, os vadios
lançaram mão de todo tipo de manobra indecorosa para obter ouro... A eles são
dispensados adjetivos relacionados a traições e assassinatos cruéis...
Os
vadios eram, então, transgressores e criminosos, pessoas que, tendo a
possibilidade de escolher entre as atividades laboriosas e a “negação do
trabalho”, preferiam a transgressão e a vadiagem relacionadas à última opção.
Em Antonil, o sistema produtivo é descrito como perfeito, enquanto que a “má
índole dos indivíduos” vadios deve ser criticada porque só podia resultar em “traições
lamentáveis” e assassinatos cruéis. A síntese aí é a de um tipo completamente
inútil à sociedade.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/os-vadios-do-seculo-xviii-de-laura_20.html
Um abraço,
Prof.Gilberto