quarta-feira, 15 de novembro de 2017

“A Relíquia”, de Eça de Queiroz – da “Biblioteca Universal” – banhando-se no Jordão; ecos do passado bíblico; Topsius investiga as ruínas de Jericó; um pouco sobre Herodes, o Grande; tudo em ordem no acampamento; Teodorico se decide por um passeio a pé

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/11/a-reliquia-de-eca-de-queiroz-da_55.html antes de ler esta postagem:

À frente as elevações que constituem o Moabe foram avistadas...
Teodorico imaginou que tudo em volta, e também o céu, parecia descansar do tumultuado passado marcado pela presença do povo escolhido de Deus, com suas preces, batalhas e mortandades.
Na esbranquiçada altitude já não se viam anjos... Era bom saber que no momento apenas alguns pombos revoavam na direção dos pomares de Engada.
O rapaz não se esqueceu da recomendação da tia Patrocínio... Despiu-se e mergulhou o corpo nas águas do Jordão para um santificado banho... Ao pisar as areias fez reverência como se estivesse pisando tapete destinado a um altar sagrado.
Logo que as águas chegaram aos joelhos, Teodorico pensou em São João Batista e rezou um “padre-nosso”... Na sequência, riu um pouco e regozijou-se... Tudo ali era agradável e o remanso lembrava a uma “banheira entre árvores”. Pote arremessou-lhe a esponja.
Enquanto se ensaboava nas águas do batismo, cantarolava o fado de Adélia.
(...)
Depois, quando já se preparavam para deixar o local, Teodorico e Topsius observaram a chegada de beduínos que traziam seus camelos para as margens do Jordão.
Os homens vinham desde as colinas de Galgalá com as suas lanças compridas. Soltavam gritos que motivavam os felpudos animais. A cena fez Teodorico mais uma vez imaginar os remotos tempos bíblicos, “quando Agar era moça”... Pensou sobre os que empunharam espadas e entraram em combate por defenderem um deus... A atmosfera o levou a imaginar-se personagem daqueles tempos.
(...)
O alto do Moabe estava encoberto de brilho e luminosidade diferenciada, algo dourado e “cor de ouro”... Topsius anunciou que Moisés havia morrido no alto do Moriá e novamente Teodorico encheu-se de emoção... Naquele instante sentiu-se carregado de energia como se também ele fosse um dos liderados por Moisés no Êxodo...
Aquelas eram paragens das doze tribos... Mas então, o que teria à sua frente se o tempo fosse dos antigos? Levitas muito bem trajados deviam carregar a Arca dourada... Certamente anjos fariam a escolta... Cânticos se elevariam aos céus...
Aproximavam-se de Jericó e esses devaneios não se apartavam de Teodorico... Não é para menos... Quanta emoção ao se avizinharem da “terra da promissão”... Areias secas ardentes e mais à frente toda brancura de Jericó!
Os ouvidos do rapaz pareciam escutar “os clarins de Josué”.
A emoção era tal que Teodorico tirou o capacete e soltou a voz para que toda Canaã pudesse ouvir sua piedosa saudação: “Viva Nosso Senhor Jesus Cristo! Viva toda a corte do céu!”
(...)
Na manhã do dia seguinte, um domingo, Topsius equipou-se e saiu às ruínas. Estudioso que era, não podia deixar de investigar as ruínas de Jericó... Herodes* a equipara e a enfeitara... A cidade fora conhecida por suas palmeiras, termas, templos, jardins e estátuas...

                  * O texto se refere a Herodes, o Grande. Dá a entender que, em Jericó, este monarca passou “tortuosos amores com Cleópatra”... Essa não deve ser confundida com a rainha do Egito (que era sua rival). A Cleópatra em questão deve ter sido uma de suas nove esposas.

(...)
O Raposo não acompanhou o estudioso alemão.
Enquanto tomava o café observou os afazeres dos que os acompanhavam... O cozinheiro estava concentrado em sua tarefa de preparar frangos para a próxima refeição; o peão que devia cuidar das montarias se distraía com um bando de cegonhas que se dirigiam à Samaria...
Nada ali reclamava a sua intervenção...
Então decidiu passear pelo entorno.
Colocou o capacete e iniciou a caminhada...
Descansou as mãos nos bolsos e seguiu cantarolando um fado.
Pensou em Adélia e também no Senhor Adelino.
Leia: A Relíquia – Coleção “Biblioteca Universal”. Editora Três.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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