sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

“A Resistência”, de Julián Fuks – considerações sobre o livro – Última Parte

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/01/a-resistencia-de-julian-fuks.html antes de ler esta postagem:

À excessão do episódio sobre a "guerra de travesseiros", que traumatizou o adotivo, pouca referência se faz à irmã.
Os jovens foram se separando cada vez mais. O adotivo assumiu uma postura de reclusão. Ele pouco se retirava do quarto, pouco comparecia à mesa e ausentava-se dos demais momentos de reunião familiar.
O rapaz tornou-se enigmático e todos se angustiaram com a situação. Embora sempre tivessem buscado garantir-lhe condições satisfatórias, sua reação era de aversão. Por isso não conseguiam entendê-lo.
Seus hábitos tornaram-se noturnos e estranhos aos familiares. Por ocasião de seu aniversário convidava os amigos para uma ruidosa comemoração.... Acostumaram-se a isso e participavam mantendo certo distanciamento.
(...)
Houve um desabafo e o enigmático adotivo extravasou que não o compreendiam. Explicou que aquilo era o resultado do modo como os irmãos se fechavam em seus objetivos acadêmicos (medicina, a irmã; literatura, Sebastián)... Em seu entendimento todos se mostravam conhecedores, pois muito falavam e muito liam, todavia não conseguiam enxergar a realidade.
De sua parte, sentia-se como se lhe enfiassem uma agulha na veia... Por trinta anos havia sido assim e no momento em que desabafava garantiu que de nada adiantaria arrancarem-lhe a agulha porque ela já “fazia parte de seu corpo”.
Retirou-se e se dirigiu a Sebastián sugerindo que ele se esforçasse para escrever “sobre ser adotado”.
(...)
Vemos Sebastián aplicando-se na tarefa de escrever “sobre ser adotado”. Vemos que ele busca as origens da família e se esforça para, dessa maneira, aproximar-se do outro.
Durante este processo chegou a visitar o endereço onde os pais haviam morado em Buenos Aires... Conheceu o Museu da Memória, onde pôde contemplar fotografias das desesperadas mães e avós da “Plaza de Mayo”.
Nos primeiros anos de Regime Ditador na Argentina mais de quinhentas crianças foram sequestradas assim que nasceram. O irmão adotivo podia ser um desses casos.
No momento mesmo em que se anunciou a recuperação do neto de Estela de Carlotto (liderança que há mais de trinta anos reúne mães e avós na praça, onde exigem respostas para seus reclamos e punição aos algozes), Sebastián estava presente entre os que se concentraram na praça para saudar o acontecimento e ouvir as emocionantes palavras de Carlotto.
Sebastián ficou comovido com o evento histórico e ainda mais se convenceu da importância de sua investida para reatar as relações do adotivo com os familiares.

(...)

Os pais conheciam bem as definições de Donald Woods Winnicott a respeito da “centelha vital” que toda criança carrega em si e que, em síntese, se relaciona ao processo de autonomia... O que dera errado na educação do adotivo? Psicanalistas que eram, entendiam que não podiam ser os responsáveis por qualquer desvio.
(...)
Deram início a uma terapia de grupo e o adotivo se dispôs a falar... Sebastián compreendeu um pouco de toda complexidade que cerca sua família, e isso se tornou mais razoável na medida em que teve condições de se colocar no lugar do outro.
Depois de uma das reuniões apresentou os resultados de sua produção textual ao pai e à mãe.... Os dois consideraram o texto sincero, embora estivesse carregado de informações que não correspondiam à verdade dos fatos (sobre as armas embaixo da cama; reunião com exilados no Parque da Água Branca, ocasião em que lhes teria sido apresentada uma granada como arma essencial para o combate aos ditadores argentinos...).
O pai sentenciou que Sebastián poderia “ir em frente”, pois podia ocorrer de alguém ler em sua produção “um bom romance”.

Este é o nosso caso.

Leia: A Resistência. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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