No meio da madrugada dois policiais encontraram Kapuscinski perdido em sua tentativa de se proteger da tempestade e do frio... Seu estado era lastimável... Os fardados pretendiam encaminhá-lo à delegacia, mas ele apresentou os documentos e conseguiu explicar a sua história... Então ficou sabendo que a guerra se desenvolveu a pleno vapor durante toda a noite.
Mas o front era longe da capital, e ali não se ouviam os disparos.
(...)
Os habitantes de Tegucigalpa se organizavam como podiam... Esperavam um
ataque para qualquer momento... Então cavavam valas e organizavam barricadas.
Armazenavam provisões e protegiam vidraças, portas e paredes.
As pessoas corriam de um
lado para outro sem motivos aparentes... Jovens estudantes pichavam os muros
com palavras de ordem. Kapuscinski destaca algumas das frases que avistou por
aqueles dias:
* “Que não sonhem cabeças duras
Conquistar o
nosso Honduras”
* “Compatriotas!
Sem temor,
Degolar o agressor”
* “Vinguemos o 3x0”
* “Infâmia
a Porfírio Ramos
Que vive com uma salvadorenha!”
* “Quem avistar Raimundo Grandos
Deve
informar a polícia –
Trata-se de
um espião de El Salvador!”
O polonês tece comentário crítico à situação que certamente era comum
aos dois países... Os nervos estavam à flor da pele e as pessoas comuns
enxergavam espiões em cada esquina... Também os comunistas estavam sendo
atacados... Muitos inimigos do socialismo aproveitavam a onda para
incriminá-los.
(...)
Então o próprio Kapuscinski tinha motivos para
alimentar temores, já que se tratava do único correspondente vindo de país
socialista... Ele podia, por exemplo, ser expulso a qualquer momento.
Decidiu se aproximar do operador de telex da agência de correio, Jose
Málaga... Enquanto tomavam cerveja o tipo confessou-lhe que também andava
assustado, já que sua mãe era salvadorenha... Ele se enquadrava entre os tipos
que consideravam suspeitos...
Não era por acaso que Jose telefonava a quase todo instante à mãe para
informar-lhe a respeito de sua condição, e também para saber se estava tudo bem
com ela... O polonês entendeu que sua condição era semelhante à do outro.
E havia motivos reais para se preocupar porque a polícia estava
prendendo as pessoas de “nacionalidade mista” (como era o caso do funcionário
do correio) e os salvadorenhos. A quantidade de presos por causa da guerra
crescera tanto que as autoridades organizaram “campos provisórios” para
acomodá-los... Em vários casos, estádios de futebol cumpriam satisfatoriamente essa
função.
Kapuscinski destaca a observação a respeito da dupla função dos estádios:
em tempos de paz acomodam fanáticos torcedores para as partidas de futebol; “em
tempos de crise são transformados em campos de concentração”.
(...)
Quarenta correspondentes
mexicanos chegaram a Tegucigalpa no meio do dia... Eles viajaram de avião até a
Guatemala e, de lá para a capital de Honduras, seguiram de ônibus, já que o
aeroporto estava fechado.
Kapuscinski juntou-se a
eles, pois pretendiam seguir para o front. Para o bom encaminhamento da missão pretendiam
coletar informações do governo local e obter autorização dos homens de guerra
para seguir adiante... É por isso que todos se encaminharam para o palácio
presidencial, no centro da capital.
Outros estrangeiros
juntaram-se à delegação.
(...)
O local respirava atmosfera bélica...
O autor descreve o prédio
destacando sua cor azul brilhante e a construção de “traços feios”.
A sede do governo estava
cercada por tropas muito bem armadas. Além dos sacos de areia que protegiam as
metralhadoras, canhões antiaéreos estavam instalados no pátio.
O capitão que fazia as vezes de intermediário
entre o exército e a imprensa apareceu para conversar com os jornalistas
estrangeiros.
Leia: A
Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto