terça-feira, 9 de junho de 2015

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – Henri e Dubreuilh revisitam sua atuação política no pós-guerra; uma análise dos fracassos desde os tempos em que a empolgação por independência política havia sido legítima

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/06/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_8.html antes de ler esta postagem:

Robert quis logo saber o que havia ocorrido... Manifestou sua suspeita ao perguntar se Lambert deixara o jornal... Henri explicou que já fazia algum tempo que Trarieux e o rapaz pretendiam debandar para o gaullismo, e isso explicava a dissidência. Falou sobre a discussão com Lambert e esclareceu que tudo se encaminhou para o rompimento após as pressões que ele impôs ao rapaz.
Dubreuilh começou a rir e disse que estavam de volta ao “marco zero”... Haviam lhe subtraído L’Espoir... Também o SRL já não existia.
Henri quis assumir a culpa pelos fiascos... Mas Dubreuilh sentenciou que não havia culpados... Então retirou uma garrafa de armagnac do armário e encheu duas taças.

Enquanto bebiam e trocavam gentilezas, falaram sobre Anne, que ainda estava nos Estados Unidos, de onde deveria regressar em duas semanas... Dubreuilh fez questão de dizer que ela não aceitava o fato de os dois amigos terem rompido e não mais se entenderem... Henri concordou que o litígio entre ambos era mesmo muito estúpido.
Essa conversa foi interrompida quando Dubreuilh quis saber se era verdade que Paule estava curada... Sabia-se que ela seria instalada na casa de Claudie de Belzunce e que, por orientação médica, devia ser mantida distante de Henri.
Dubreuilh parabenizou Henri por, enfim, poder curtir a liberdade que tanto almejara... Então perguntou sobre o que faria com o tempo livre que estava conquistando... Poderia fazer muitas coisas... Henri admitiu que talvez se dedicasse à finalização do romance que não saía de sua escrivaninha, mas deixou claro que alguns remorsos o atormentavam.
A esse respeito, garantiu que se não tivesse se comportado com tanta obstinação as cotas de Lambert seriam passadas para Dubreuilh e, assim, L’Espoir e SRL teriam se mantido firmes.
Robert Dubreuilh sentenciou que, de toda maneira, o SRL estava se encaminhando para a nulidade... O jornal talvez resistisse, mas será que conseguiria se manter independente no momento em que os rivais gaullistas e comunistas mais aqueciam a temperatura política?
A verdade é que nem mesmo a Vigilance tinha garantias de sobrevida independente...
(...)
Falaram sobre essas coisas... Henri tinha certeza de que tinha sua parcela de culpa, mas Dubreuilh prosseguia em sua análise que beirava o fatalismo... Ele deixou claro sua opinião ao reconhecer que após a guerra a disputa passou a ser entre Estados Unidos e União Soviética; e que estava claro que não haveria espaço para a corrente política que defendiam.
Henri ponderou que a Europa, e a França em particular, tinha um “papel a desempenhar”... Dubreuilh respondeu em tom desanimado que a análise que fizeram era das mais equivocadas...
Essas afirmações estavam em consonância com suas declarações em seu ensaio a respeito dos limites dos intelectuais, que nada podem em relação à atuação política e aos rumos da sociedade na conjuntura de pós-guerra... Henri tentou argumentar que já se sabia que eram minoria, mas na ocasião das discussões o próprio Dubreuilh admitira que poderiam ser eficientes.
Dubreuilh pôs-se a falar apressadamente... Considerou que a atuação da Resistência fora diferenciada e, no limite, a agitação a que se dispunha podia ser tarefa de uma minoria... A “reconstrução” que veio depois se tornou obra impraticável... Agora podia afirmar categoricamente que apenas o ímpeto dos companheiros não bastaria para fazer frente às pressões...
(...)
Henri refletiu sobre aquelas considerações... Ele sabia que Dubreuilh mantinha o seu gênio de conduzir seus interlocutores para onde bem entendesse... Aquelas opiniões todas que ele estava despejando haviam sido do próprio Henri... Ele mesmo nem queria se envolver com política. Agora se via na obrigação de dizer que haviam “errado no golpe”... Porém deixou claro que se não tentassem estariam cometendo um grave erro.
Obviamente Dubreuilh concordou... De fato não provocaram mal a ninguém por terem feito política no pós-guerra. Mas insistiu que deveriam entender que “erraram o caminho”... Para sustentar essa conclusão, disse que bastaria reler o que escreveram às vésperas da libertação... Henri completou dizendo que, de fato, eram otimistas... Dubreuilh deu de ombros porque, em síntese, também pensava dessa forma e arrematou que aqueles foram tempos em que podiam mesmo esperar o “triunfo do bom direito” e o “futuro prometido aos homens de boa vontade”.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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