Como
vimos, Brunet de Latuque chamou a atenção dos demais deputados a respeito do
princípio geral da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão para
alertá-los que “as opiniões religiosas” não podiam motivar a exclusão de
cidadãos em relação aos direitos... O abade Jean Maury apelou para o fato de os
protestantes já exercerem direitos como os católicos e discursava em favor deles.
O fato é que as discussões que ocorreram em agosto de 1789 por ocasião
da aprovação da Declaração não resolveram questões que foram postergadas e
abertas para debates futuros de questões mais locais. De certo modo,
protestantes e “alguns judeus” se adiantaram em relação às possibilidades que
se apresentaram.
Como vimos, os protestantes
sofriam várias perseguições antes de 1787, ano em que foi promulgado o Edito de
Tolerância... Em relação aos judeus na França, sabe-se que não eram penalizados
por professarem sua religião em público, todavia não tinham direitos políticos
reconhecidos. Poucos direitos civis lhes eram garantidos e não poucos questionavam
abertamente a sua condição de “franceses”.
O fato é que enquanto os protestantes eram vistos como
franceses que optaram pelo Calvinismo, os judeus eram estrangeiros que, na França,
formavam uma nação à parte. Assim, os alsacianos que professavam o judaísmo “eram
conhecidos oficialmente como ‘a nação judaica da Alsácia’”.
Evidentemente a ideia de “nação”, neste caso, não se relaciona a
qualquer conteúdo nacionalista com o significado que o conceito adquiriu durante
os séculos XIX e XX. Assim como os demais judeus que viviam na França, os
alsacianos eram vistos como “nação” por viverem “dentro de uma comunidade
judaica cujos direitos e obrigações tinham sido determinados pelo rei em cartas
patentes especiais”. Isso lhes garantia o governo de certos assuntos da
comunidade e a decisão em cortes de justiça a eles destinadas.
Somos tentados a imaginar que os judeus alsacianos gozassem
de autonomia exemplar, mas há que se ressaltar que estavam sujeitos a uma série
de restrições, como a modalidade de comércio que podiam exercer/praticar, “aos
lugares onde podiam viver e às profissões a que podiam aspirar”.
(...)
Alguns pensadores iluministas escreveram a respeito dos judeus. Nem
sempre fizeram registros positivos sobre a referida minoria... Depois do Edito
de Tolerância que beneficiou os protestantes, houve quem se dedicasse a defender
a melhoria da condição dos judeus, e o próprio Luís XVI formou uma comissão em
1788 para analisar a situação... Ela não gerou qualquer resultado devido à
precipitação dos acontecimentos que antecederam a Revolução.
Era praticamente consensual que a questão judaica seria discutida pela
Assembleia depois de resolvidos os assuntos relativos aos protestantes. Tornou-se
evidente que logo após as votações do final de dezembro a atenção de todos se
voltaria a ela. De fato, as discussões se iniciaram, porém elas não resultaram na
aprovação imediata de direitos aos judeus.
Alguns dados referentes às
queixas e petições elaboradas por comunidades na época da convocação de
eleições para os Estados Gerais mostram o interesse em relação aos judeus. Lynn
Hunt destaca que:
“Trezentas
e sete listas de queixas redigidas na primavera de 1789 mencionavam
explicitamente os judeus, mas a opinião estava claramente dividida. Dezessete
por cento urgiam pela limitação do número de judeus permitidos na França e 9%
advogavam a sua expulsão, enquanto apenas 9-10% insistiam na melhoria de suas
condições. Entre as milhares de queixas, apenas oito advogavam a concessão de
direitos iguais aos judeus. Ainda assim, era um número maior do que o daquelas
que faziam a reivindicação para as mulheres”.
Continua em
https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/08/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_3.html
Leia: A
Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto