domingo, 2 de agosto de 2020

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – as demandas dos judeus na pauta das discussões da Assembleia; judeus na França entendidos como nação à parte; cartas patentes especiais não incluíam direitos civis ou políticos à comunidade; os iluministas e a questão judaica; infrutífera comissão criada por Luís XVI; números contidos em queixas e petições com referências aos judeus encaminhadas aos representantes dos Estados Gerais

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/07/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_31.html antes de ler esta postagem:

Como vimos, Brunet de Latuque chamou a atenção dos demais deputados a respeito do princípio geral da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão para alertá-los que “as opiniões religiosas” não podiam motivar a exclusão de cidadãos em relação aos direitos... O abade Jean Maury apelou para o fato de os protestantes já exercerem direitos como os católicos e discursava em favor deles.
O fato é que as discussões que ocorreram em agosto de 1789 por ocasião da aprovação da Declaração não resolveram questões que foram postergadas e abertas para debates futuros de questões mais locais. De certo modo, protestantes e “alguns judeus” se adiantaram em relação às possibilidades que se apresentaram.
(...)
Como vimos, os protestantes sofriam várias perseguições antes de 1787, ano em que foi promulgado o Edito de Tolerância... Em relação aos judeus na França, sabe-se que não eram penalizados por professarem sua religião em público, todavia não tinham direitos políticos reconhecidos. Poucos direitos civis lhes eram garantidos e não poucos questionavam abertamente a sua condição de “franceses”.
O fato é que enquanto os protestantes eram vistos como franceses que optaram pelo Calvinismo, os judeus eram estrangeiros que, na França, formavam uma nação à parte. Assim, os alsacianos que professavam o judaísmo “eram conhecidos oficialmente como ‘a nação judaica da Alsácia’”.
Evidentemente a ideia de “nação”, neste caso, não se relaciona a qualquer conteúdo nacionalista com o significado que o conceito adquiriu durante os séculos XIX e XX. Assim como os demais judeus que viviam na França, os alsacianos eram vistos como “nação” por viverem “dentro de uma comunidade judaica cujos direitos e obrigações tinham sido determinados pelo rei em cartas patentes especiais”. Isso lhes garantia o governo de certos assuntos da comunidade e a decisão em cortes de justiça a eles destinadas.
Somos tentados a imaginar que os judeus alsacianos gozassem de autonomia exemplar, mas há que se ressaltar que estavam sujeitos a uma série de restrições, como a modalidade de comércio que podiam exercer/praticar, “aos lugares onde podiam viver e às profissões a que podiam aspirar”.
(...)
Alguns pensadores iluministas escreveram a respeito dos judeus. Nem sempre fizeram registros positivos sobre a referida minoria... Depois do Edito de Tolerância que beneficiou os protestantes, houve quem se dedicasse a defender a melhoria da condição dos judeus, e o próprio Luís XVI formou uma comissão em 1788 para analisar a situação... Ela não gerou qualquer resultado devido à precipitação dos acontecimentos que antecederam a Revolução.
Era praticamente consensual que a questão judaica seria discutida pela Assembleia depois de resolvidos os assuntos relativos aos protestantes. Tornou-se evidente que logo após as votações do final de dezembro a atenção de todos se voltaria a ela. De fato, as discussões se iniciaram, porém elas não resultaram na aprovação imediata de direitos aos judeus.
Alguns dados referentes às queixas e petições elaboradas por comunidades na época da convocação de eleições para os Estados Gerais mostram o interesse em relação aos judeus. Lynn Hunt destaca que:

                   “Trezentas e sete listas de queixas redigidas na primavera de 1789 mencionavam explicitamente os judeus, mas a opinião estava claramente dividida. Dezessete por cento urgiam pela limitação do número de judeus permitidos na França e 9% advogavam a sua expulsão, enquanto apenas 9-10% insistiam na melhoria de suas condições. Entre as milhares de queixas, apenas oito advogavam a concessão de direitos iguais aos judeus. Ainda assim, era um número maior do que o daquelas que faziam a reivindicação para as mulheres”.

Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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