domingo, 13 de janeiro de 2013

“O Queijo e os Vermes”, de Carlo Ginzburg – livros e contato do camponês com termos acadêmicos; o método “Fioretto della Bibbia”

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg.html antes de ler esta postagem:

Sem dúvida, o movimento reformista e a prensagem de textos foram acontecimentos importantes... No caso em questão, permitiram que um tipo como Menocchio, de provinciana comunidade, pudesse vivenciar as situações relatadas... Como sabemos, ele acabou sustentando ideias muito perigosas para o seu tempo...
Em consonância com o pensamento reformista, Menocchio levou a cabo a prerrogativa de falar sobre o que pensava da Igreja e do mundo que o cercava... Em relação aos textos impressos, sabemos o quanto foram utilizados (à sua maneira), e como se apropriava de trechos, frases e palavras para justificar o seu pensamento ante as autoridades religiosas... Notamos que, oriundo de um meio analfabeto, o moleiro valorizava os conteúdos implícitos nos textos a que tinha acesso... Seguia posicionando-se desafiadoramente ao sentenciar que os inquisidores e as demais autoridades religiosas jamais admitiriam que os pobres conhecessem o conteúdo que eles tinham por exclusivo.
As palavras de Menocchio mesclavam termos comuns do cotidiano camponês a palavras acadêmicas... No Fioretto della Bibbia ele teve acesso a conceitos “perfeito”; “imperfeito”; “substância”; “matéria”; “vontade”; “intelecto”; “memória”... Eles aparecem em seus depoimentos mesclados a outros do cotidiano camponês: “criança no ventre da mãe”; “rebanho”; “carpinteiro”; “banco”; “trabalhador”; “queijo e vermes”...
No capítulo III do Fioretto (como Deus não pode querer o mal e muito menos recebê-lo) nota-se a mistura dos termos cotidianos aos acadêmicos... Há um trecho que justifica o enunciado garantindo que Deus “ordenou os elementos de forma que um não interferisse no outro (...). Alguns dizem que o mundo durará eternamente, (...), quando um corpo morre, a carne e os ossos voltam àquela matéria a qual foram criados (...) podemos ver facilmente a função da natureza, como ela concilia coisas discordantes de modo que todas as diversidades são reduzidas à unidade, (...) em cada substância: e combina também em plantas e sementes”.
Na sequência temos os exemplos da combinação do homem e da mulher; e o do planeta Júpiter, que gera outras criaturas (e através dele) outras são geradas de acordo com a ordem na natureza.
O Fioretto usava o método escolástico (enunciado de uma tese e o desmantelamento de “opiniões errôneas”). Embora “pobre e desordenado” este material aguçou a curiosidade intelectual de Menocchio... O Fioretto fazia ataque às especulações filosóficas acerca da alma (no capítulo XXVI: como Deus inspira as almas nos corpos; se são eternas; se são uma e os elementos quatro e mais o Orbis do qual Deus teria feito a alma de Adão e todas as demais; se são espíritos malignos que decaem e entram nos corpos humanos um após o outro conforme morrem, ...).
A reação de Menocchio aos ataques do Fioretto àquelas livre-interpretações foi a de “procurar coisas maiores” e, incentivado pela pluralidade de ideias, formular o seu próprio pensamento servindo-se de conjecturas diversas, que não lhe pertenciam... O resultado foi a mistura de idéias (“embebidas de cristianismo, neoplatonismo e filosofia escolástica”) que justificavam o “materialismo elementar” transmitido oralmente entre os camponeses.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/03/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg.html
Leia: O Queijo e os Vermes. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto 

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