De fato, o comandante do quartel deixou a casa da Cavalhada... A casa da família de Helena que ele havia alugado durante o curto período em que dona Carolina morou com as irmãs na casa da Rua Direita.
Sem entrar em detalhes a respeito do desenrolar das intrigas sobre o inventário de dona Teodora, Helena passou a escrever (os registros são de 17 de novembro de 1895) a respeito dos exames finais da escola.
(...)
Ela explica que chegava ao final do ano escolar sentindo inveja das
colegas mais dedicadas aos estudos... Enquanto as demais moças estavam
preparadas, seu caso era crítico e a levava a recorrer às promessas aos santos.
Cada
um sugeria uma coisa diferente e isso a deixava confusa. Santo Antônio não
parecia ser a melhor indicação, sobretudo porque dona Carolina havia contado a
respeito de situações em que ele falhara. Mas muitos diziam que as promessas
dirigidas a ele são certeiras quando o assunto é o matrimônio.
Ensinaram que para se
obter êxito com Santo Antônio é preciso amarrar a imagem pelo pescoço e
abandoná-la num tanque com água... Muitas “casamenteiras” garantiam que isso
não falhava. Depois que o pretendente surgisse com proposta de casamento era só liberar a
imagem.
A
desconfiança de Helena em relação ao sucesso nos exames era tanta que resolveu
apelar para o santo com a fama de atender os desejos das desesperançadas.
(...)
As provas escritas e
orais se aproximavam... Helena não estava preparada, pois não dominava a
maioria dos “pontos” que deviam ser estudados. E eram muitos! Ela sabia que um
de seus principais defeitos era o de se concentrar nas matérias que mais
gostava... Sabia que em várias ocasiões contara com a sorte, mas isso vinha
falhando com certa frequência.
Todo final de ano era
a mesma coisa! Aproximavam-se os dias de exames escolares e ela se lamentava
por ter se distraído com as amigas de “vadiação”. Nessas ocasiões dizia para si
mesma que precisava mudar, mas logo que o ano seguinte de estudos se iniciava percebia
que não conseguiria se corrigir.
Entendia que as
demais colegas que não se envolviam nas diversões cotidianas se sacrificavam
demais. Uma delas era certa Mercedes, que numa ocasião falou-lhe a respeito de
seu método de estudo. Helena concluiu que não tinha a menor condição de “acompanhá-la”
em sua disciplina.
O ditado que fazia
sentido para Helena era “Mais vale quem Deus ajuda, do que quem cedo madruga”...
Se Deus a ajudasse, como sentia que ocorria frequentemente, tudo terminaria
bem... É verdade que o resultado em seu primeiro ano na Escola Normal fora um
fiasco, todavia ela era ainda muito nova em 1893.
(...)
Dona Carolina sempre se engajava nessas ocasiões... Mas ela era das que
recorrem às orações e promessas.
Helena explica que a mãe estava “fazendo uma comunhão reparadora” na
intenção de que os filhos se saíssem bem nos exames. Como as rezas dela eram “infalíveis”,
esperava passar de ano... Não tinha tanta certeza em relação ao seu irmão
Renato.
(...)
Em seus registros do dia 22 de novembro de 1895,
Helena apresentou considerações dobre o primeiro dos exames finais. Naquela sexta-feira
foram realizadas as provas escrita e a oral de História.
Suas colegas
garantiram que não havia necessidade de estudar, pois era só preparar uma cola
bem feita para a prova escrita... Em quinze minutos podia-se fazer uma revisão
do ponto para a chamada oral e tudo se resolveria.
As meninas elaboraram uma “sanfona” e a utilizaram durante a prova
escrita... Helena sentou-se na última carteira e resolveu abrir o livro para
copiar as respostas diretamente de suas páginas.
Aconteceu
que ela notou que o professor (Doutor) Teodomiro a observava... Obviamente isso
a assustou e por isso guardou o livro na gaveta. Mas em vez de adverti-la, o
mestre não disse nada, sorriu-lhe e abriu um jornal dando a entender que ela
podia continuar a sua cola.
O exame oral também foi
satisfatório... Helena explica que respondeu “umas datas e embrulhou umas
coisas”.
Sobre o professor Teodomiro, acrescentou em sua redação que que ele era
um tipo escuro... Por tudo o que se sucedera durante a prova, só podia considerá-lo
um homem bom! Bem diferente da ideia que seu pai tinha a respeito dos negros
(seu Alexandre dizia que “gente escura não presta”)...
Na
opinião de Helena, além do doutor Teodomiro, outro bom professor era o seu
Artur Queiroga, que também era negro. E os professores brancos? Eles eram “crus
de ruindade”!
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/07/minha-vida-de-menina-de-helena-morley_56.html
Leia: Minha
Vida de Menina. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto