domingo, 27 de novembro de 2016

“O Homem Duplicado”, de José Saramago – Antônio Claro não retornou; Tertuliano deixa Helena e busca respostas para as ausências; também Maria não voltará

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/11/o-homem-duplicado-de-jose-saramago-de.html antes de ler esta postagem:

O relógio acusava que a metade do dia havia se passado... Nada de Antônio Claro... Pelo visto não viria... Algum imprevisto devia ter ocorrido. Ainda mais que o carro da viagem pertencia ao próprio Tertuliano, e este sabia bem que o veículo já era velho e suscetível a avarias mecânicas diversas.
O professor viu-se preocupado... Mais uma hora se passou... Helena anunciou que almoço estava na mesa... Ele respondeu que estava sem apetite e que precisa sair... Emendou que era melhor que ela comesse sozinha.
A mulher perguntou o que havia acontecido... Ocorrera-lhe algum mal estar?
Pode ser que ele quisesse dar uma resposta mal educada... Afinal nem eram casados e, sendo assim, não se sentia na obrigação de dar-lhe satisfações. Em vez disso, falou que depois explicaria o que estava acontecendo.
(...)
Sabemos que esse tipo de compromisso era bem típico do professor Tertuliano... Maria da Paz, sobre quem obviamente também não tinha notícias, ainda aguardava toda verdade sobre a carta à produtora.
Ainda não é tempo de sabermos se Helena conhecerá a verdade sobre o que estava ocorrendo... Nitidamente amargurada, sugeriu que o “esposo” trocasse a roupa para sair... Tertuliano concordou e deu a entender que vestiria calça e casaco.
(...)
Tertuliano seguiu seu caminho... Helena o havia acompanhado até a porta do elevador. Sem entender a repentina frieza com que ele a estava tratando, sentiu que o estado depressivo a atormentaria novamente.
Depois que se viu sozinha no apartamento chorou copiosamente enquanto perguntava a si mesma o que estava se passando.

(...)

No moderno carro do Antônio Claro, Tertuliano também não obtinha respostas para as suas dúvidas. Imaginou que o melhor que tinha a fazer era dirigir até um lugar mais afastado para buscar uma reflexão metódica até chegar a uma conclusão...
Aconteceu que logo nas primeiras manobras ao volante entendeu que bastaria telefonar à Maria da Paz... Então guiou o veículo até uma cabine telefônica.
(...)
A cabine estava que era um calor só... Tertuliano registrou o número da noiva. A voz de uma
desconhecida o atendeu... A mulher quis saber quem chamava... Tertuliano disse que pretendia falar com Maria da Paz... A outra insistiu e perguntou novamente quem pretendia falar... Ele respondeu que se tratava de um colega de trabalho de Maria.
Aqui é preciso registrar as palavras que Saramago “colocou” na boca da mulher: “A menina Maria da Paz morreu esta manhã, um desastre de automóvel; vinha com o noivo e morreram os dois, foi uma desgraça, uma grande desgraça”.
Obviamente o Tertuliano sofreu um choque daqueles que levam ao pior trauma... O calor mais ainda se tornou insuportável na cabine... Pronunciou algumas palavras desconexas... Nem ele mesmo teria condições de ordená-las de modo lógico. É certo que quis que a mulher se explicasse... Perguntou o que ela havia acabado de dizer.
Também não temos condições de saber o que a mulher conversou... Provavelmente repetiu o que disser e adiantou algumas conclusões ou especulações.
Tertuliano ficou transtornado... Aos poucos foi afastando o auscultador do rosto até acomodá-lo no aparelho.
O grito de revolta que saiu de sua garganta foi contra Antônio Claro... Soltou um “mataste-a!”.
(...)
Uma tragédia...
Também para ele, Tertuliano.
Ele tinha de se sentir culpado pela morte da amada... Ele era o que vacilava e não teve coragem de protegê-la... Ele foi à desforra... Sua sede de vingança tornou-se a sua maior motivação!
(...)
Maria da Paz era a inocente vítima da estranha história de duplicados...
Agora Tertuliano era exclusivo, não era cópia de ninguém... Assim, não estava mais “sobrando no mundo”. Todavia sentia ódio de Antônio Claro... Um sentimento daqueles que parecem ter origem no ódio que a pessoa tem de si mesma.
De certo modo procurou uma justificativa para o seu egoísmo... Teria como suportar a igualdade absoluta?
Nós sabemos que ele se esforçou para “enterrar de vez” a história da duplicação... Resolveu se casar com a Maria... Mas tudo se perdera.
(...)
Saiu da cabine, e caminhou como se embriagado estivesse.
Entrou no carro e sentou-se no assento do motorista... Seu olhar tornou-se paralisado... As lágrimas chegaram aos olhos e inundaram o rosto...
Leia: O Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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