sexta-feira, 28 de outubro de 2016

“O Homem Duplicado”, de José Saramago – um croqui e um bilhete; comparando as grafias e aprendendo a escrever como o outro; por que não conhecer previamente o palco do esperado encontro?

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/10/o-homem-duplicado-de-jose-saramago_28.html antes de ler esta postagem:

Na sexta-feira chegou o envelope do Antônio Claro... Havia um croqui desenhado por ele mesmo, um pequeno mapa com as indicações para se chegar ao local do encontro. Um bilhete definia o horário: seis da tarde.
Tertuliano analisou a letra do outro... Não era exatamente igual à sua... Principalmente nas maiúsculas podiam ser notadas algumas diferenças.
O mapa era simples. Ao analisá-lo, entendeu que pegaria uma rodovia específica na saída da cidade... A certa altura passaria por uma povoação e depois de mais oito quilômetros por outra... Cada uma estaria num lado diferente da estrada. O desenho dava a entender que depois da segunda povoação devia sair da estrada principal e rumar em direção a outro povoado bem menor que os anteriores. Para se chegar ao local assinalado como “casa” devia dirigir mais adiante por uma estradinha acanhada. Tudo muito simples, não havia como errar...
O professor pegou um mapa dos que são impressos pelas editoras de guias para os motoristas e conferiu as informações de Antônio Claro... Tudo batia... Depois ficou a pensar que não precisaria levar o grande espelho. Imaginara que se encontrassem ao ar livre, talvez nas proximidades de uma grande árvore... Na casa certamente haveria espelhos.
Também era certo que Antônio Claro apareceria sozinho... Quer dizer, não fazia sentido levar a esposa para servir de árbitro nas comparações dos detalhes que cada um trazia no corpo... O fato de o tipo afirmar que compareceria armado eliminava a hipótese de uma acompanhante.
(...)
A conclusão era óbvia! Tertuliano chegou a pronunciar que ele também não levaria Maria da Paz...
Essa atitude beirou o ridículo! Sua relação com Maria da Paz não podia ser comparada à do casal! Bem que a Maria gostaria de ter um envolvimento mais sério com ele, mas este não era o seu caso.
(...)
Tertuliano guardou o mapa e o croqui desenhado pelo Antônio Claro... Depois tentou copiar a frase registrada no bilhete... Esforçou-se para imitar as maiúsculas. E tanto exercitou que ao final de uma folha não se poderia descobrir qualquer diferença entre as caligrafias.
O rapaz não tinha nada em mente ao se empenhar na imitação da letra do outro... Todavia nunca se sabe se haveremos de tirar proveito futuro de certas habilidades que adquirimos sem alimentarmos maiores expectativas.
O futuro é incerto para todos... Não se pode dizer “dessa água não beberei”... Saramago reforça a ideia afirmando que podem ocorrer ocasiões em que nos restará apenas a água que desprezávamos. Mas não eram essas coisas que passavam pela cabeça de Tertuliano.
(...)
Ele voltou a pegar o mapa e o croqui. Decidiu que devia conhecer previamente o sítio... Dirigiria até o ponto de encontro... Pelo menos não correria o risco de se perder no domingo.
Tertuliano era daqueles que podemos considerar “menos sociáveis”, ensimesmados e melancólicos...
Aparentemente a ideia fez muito bem para ele... Seu semblante mudou... O fato de livrar-se por algum tempo da redação de proposta pedagógica sugerida pelo diretor também lhe trouxe alívio.
(...)
As vias que dão acesso às estradas são sempre concorridas nas segundas metades das sextas-feiras... Incontáveis veículos conduzidos por motoristas apressados trafegam nas direções dos ambientes mais sossegados.
Tertuliano logo deixou para trás o congestionamento mais pesado... Seu objetivo era chegar ao local onde devia estar a casa evidenciada no croqui desenhado por Antônio Claro, fazer um reconhecimento do entorno e retornar. Só isso.
Leia: O Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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