domingo, 18 de setembro de 2016

“O Homem Duplicado”, de José Saramago – perdeu o controle da situação e não sabe como “virar o jogo”; Maria explicou a frase, Tertuliano se surpreendeu ainda mais

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/09/o-homem-duplicado-de-jose-saramago-ela.html antes de ler esta postagem:

Tertuliano disse que havia apenas “uns quantos vídeos desarrumados”... Ficou intrigado mais uma vez... Haveria uma mensagem por trás de “o caos é uma ordem por decifrar”?
A sua insistência em pensar sobre a frase deu margem para que Maria voltasse à carga... A moça emendou que “dentro dos vídeos desarrumados” também havia imagens que estavam “pegadas umas às outras de maneira a contarem uma história”... Desordenadas, as histórias “se misturariam” e teríamos o caos... Mas sempre poderíamos colocá-las em ordem e o “caos ordenado” ficaria para trás... Toda “ordem” sempre pode avançar para uma “configuração de caos”, que espera “ser ordenado”...
O professor não esperava o discurso bem costurado... Sem muita segurança, disse que ela podia estar se referindo aos “sinais ideológicos” dos quais ele lhe falara... Maria respondeu apenas que sim... Podia ficar à vontade para entender como quisesse.
(...)
Tertuliano observou que ela dava a entender que não acreditava nele... Maria explicou que isso pouco importava, pois ele é quem devia saber o que estava a investigar com aquelas fitas todas.
O rapaz voltou a insistir sobre a incrível reflexão sobre “uma ordem contida no caos e que pode ser decifrada em seu interior”.
Maria respondeu que também era de surpreender que, durante tantos meses de relação, ele nunca a tivesse considerado com capacidade e inteligência suficientes para pensar e produzir ideias.
Tertuliano quis desconversar... Disse que sabia que ela era inteligente... Maria o poupou acrescentando que certamente ele entendia que sua inteligência só podia ser inferior à dele... Provavelmente ele levava em consideração a sua condição de “pobre empregada bancária”.
Tertuliano negou... Deu a entender que jamais pensara que sua inteligência fosse maior do que a dela... A questão se resumia ao fato de a ideia externada por ela ser surpreendente... Maria quis saber se era uma “ideia inesperada” exatamente por ter sido por ela pronunciada... Depois emendou que ele (que era historiador) devia saber que os antepassados humanos tiveram ideias que os tornaram inteligentes, e que a inteligência tornou-os aptos para novas ideias.
Também essa nova sentença deixou Tertuliano admirado... Exclamou que ela se revelava paradoxal ao mesmo tempo em que o assombrava... Maria sorriu e disse que precisava fazer o café antes que ele a transformasse em “estátua de sal”.
Segura de si, enquanto se ajeitava na cozinha, pronunciava que Tertuliano, o Máximo, devia arrumar o caos. 
(...)
A lista foi trancafiada... As fitas que estavam fora das caixas foram organizadas... “O Paralelo do Terror”, que até então estivera no aparelho de vídeo, também voltou à sua caixa...
Nunca foi tão fácil “ordenar um caos desde que o mundo é mundo”.
(...)
Ainda há algo que preocupa o professor...
E isso tem a ver com o seu propósito de colocar fim à relação com Maria da Paz... Sentia-se perdendo a batalha antes de a mesma ter se iniciado.
Tudo por causa do seu discurso sobre os “sinais ideológicos”... A frase de Maria sobre “a existência de uma ordem no caos” parecia alterar suas convicções... Não se sentia à vontade para tomar a frente na discussão aguardada por ela...
De que forma dispararia que tudo estava acabado entre eles? Teria coragem de dizer que podiam continuar apenas como amigos?
Não conseguia entender onde falhara... Nem mesmo podia garantir que tivesse uma tática!
Pode-se dizer que Maria passara para o contra-ataque, incendiara-o. Estava difícil eliminar os “focos mais escondidos” que teimavam em queimar.
Ainda na tentativa de explicar o seu fracasso, cogitou que a reviravolta sofrida só podia ser explicada por sua “figura caricata”... Foi pego de surpresa... Não devia se apresentar despenteado, de pijama e chinelos, com a barba por fazer!
Se estivesse mais bem vestido, com gravata e de “sapatos engraxados” intimidaria a outra.
Tertuliano soube então que lhe faltara diplomacia e habilidade.
Maria esteve sempre na dianteira. Desde que se atirou em seus braços não perdeu mais o controle da situação.
Resta saber as novas que o café proporcionará.
Leia: O Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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