O estado de sítio foi instalado.
(...)
Agora o cenário apresenta uma praça.
Há um jardim e em um de
seus lados está a porta do cemitério. Também podemos notar o cais e, perto
dele, a casa do juiz.
Vemos que os coveiros estão recolhendo cadáveres...
Uma carroça se aproxima; o estridente ranger de suas rodas a anuncia. Os
coveiros estão usando roupas de presidiários (e é isso mesmo o que eles são).
Eles foram colocados à disposição do Regime para recolher à carroça os “mortos
do caminho”.
O veículo fúnebre se dirige ao cemitério...
Uma música militar dá o tom solene. O povaréu a tudo
acompanha.
Também há um pátio escolar... Há mesas... Numa delas está a secretária
envolvida em sua ocupação... O primeiro alcaide está posicionado um pouco mais
atrás...
O som militar aumenta e os guardas começam a expulsar as pessoas que se
aproximam demais das grades... Na parte que corresponde à portaria da escola, homens
e mulheres são devidamente colocados em grupos diferentes.
No palácio, a figura de Peste se destaca... Seus gestos indicam que ele
transmite ordens aos subalternos.
(...)
Peste mostrava indignação... Exigia pressa.
Para ele, estava claro que
os habitantes da cidade dominada não eram de dedicar afinco ao trabalho... Era certo
que não admitiria vacilações e destacou que nas casernas e filas isso seria compreensível...
Mas não em sua administração... Tinham muito a fazer!
Ordenou que sua torre fosse
finalizada o quanto antes... A vigilância devia ser eficiente... Outra tarefa
inconclusa era a de isolar ainda mais a cidade. Comentou que as pessoas comuns
tinham o hábito de cultivar sebes floridas, mas a sua Cádiz seria cercada por
arbustos que produziriam “rosas de ferro”...
Também os fornos
deviam ser acionados... Quanta demora! Aqueles seriam os festivos fornos de seu
governo e não podiam tardar a arder.
Os guardas foram chamados à atenção porque se demoravam a colocar as
estrelas sobre as casas que deviam ser marcadas... Mesmo a eficiente secretária
tinha de se apressar na redação de listas e “certificados de existências”.
(...)
Um pescador (que Camus
coloca como corifeu) quis saber por que necessitava de um “certificado de
existência”... A secretária se espantou com a pergunta e justificou que ninguém
poderia “se arranjar” sem um certificado daqueles. O homem argumentou que até
então todos viviam bem sem qualquer certidão.
A secretária explicou que anteriormente ninguém naquela
cidade conhecera governo... Argumentou que o princípio da administração de
Peste é exatamente o de impor a todos a “necessidade de um certificado”. E
concluiu: vive-se sem comer, e até sem a companhia de um cônjuge, mas uma
certidão é essencial à existência! Não importa o que o documento certifique!
O pescador redarguiu que há um bom tempo sua família vivia de lançar
redes, e que sempre trabalharam honesta e limpamente... Podia mesmo jurar sem a
necessidade de nenhum papel escrito.
Um açougueiro comentou que também a sua gente nunca
precisou de certificados para “abater carneiros”.
A secretária esbravejou que aqueles tipos simplórios viviam em
anarquia... É claro que o governo de Peste nada tinha contra os matadouros...
Sua administração estava introduzindo o “aperfeiçoamento da contabilidade”...
E nisto Peste era superior... A habilidade de seu governo em “atirar as
redes” era incomparável. Todos poderiam conferir isso em breve.
(...)
Na sequência a secretária solicitou os formulários...
O primeiro alcaide foi
rápido e apresentou os papéis no mesmo instante.
A mulher exigiu que os guardas trouxessem o
pescador à sua presença.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/10/estado-de-sitio-de-albert-camus-segundo.html
Leia: Estado
de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto