terça-feira, 31 de março de 2015

“A Legião Negra – A luta dos afro-brasileiros na Revolução Constitucionalista de 1932”, de Oswaldo Faustino – Miro se torna “doutor Miro”; seu aposento na pensão de Sinhá Clotilde sofre invasão da polícia política; fuga de trem e o temor de ser capturado

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/03/a-legiao-negra-luta-dos-afro_75.html antes de ler esta postagem:

O Miro era mesmo um monarquista...
Tão logo deixou a casa de sua protetora e madrinha, dona Berenice, fez questão de levar uma folha de jornal que estampava uma imagem de José do Patrocínio ajoelhado diante da princesa Isabel, de quem humildemente beijava a mão... Saber que o tio-avô se curvava perante a Princesa Redentora o enchia de orgulho.
A imagem passou a ter lugar de destaque na parede do quarto de pensão da Sinhá Clotilde, localizada na Rua do Triumpho... Mas isso foi por pouco tempo...
É que Miro se revoltou ao saber que o tio-avô se declarou republicano depois da Abolição...
(...)
Faustino explica que Patrocínio havia criado a Guarda Negra, formada por capoeiristas para defender a família real, mas se disse arrependido ao saber que entre seus componentes existiam alguns que se dedicavam a práticas criminosas.
(...)
Aconteceu que Miro não conseguiu ingressar na Faculdade de Direito... Não foi admitido para lecionar e tampouco o aceitaram como funcionário em algum escritório.
Sua saída foi se tornar enfermeiro na Santa Casa de Misericórdia onde, apesar de não dedicar-se plenamente à profissão (pois se envolvia com afinco na produção textual para os periódicos antirrepublicanos), passou a ser chamado de doutor Miro Patrocínio.
Ele tomou tanto gosto pelo novo tratamento que recebia que passou a usar o “doutor Miro Patrocínio” (em vez de Hermann K) nas assinaturas de seus textos cada vez mais radicais... E olha que ele não poupava nenhum republicano, fossem eles da época da República Velha ou da fase pós-1930! Oligarcas e rebeldes tenentistas eram colocados no mesmo caldeirão.
Sua ferocidade antirrepublicana rendeu-lhe a perseguição da polícia política do governo Vargas... O quarto que ele ocupava na pensão de Sinhá Clotilde foi invadido... Os agentes deduziram que a marca na parede indicando que algo foi retirado só podia se tratar de material subversivo, talvez uma relação dos contatos de outros rebeldes...
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Ao retornar para a pensão, ficou sabendo que estavam em seu encalço... Então teve tempo apenas de pegar algumas peças extremamente necessárias (seu livro de cabeceira, uma caixa de primeiros socorros e dinheiro).
Tendo se tornado um perseguido pela polícia política, Miro não teve alternativa ao não ser fugir... Mas para onde iria? Não tinha a menor ideia...
Caminhou e direção à Estação da Luz de modo discreto, e sempre que podia parava em alguns becos para observar o movimento... Sua sensação era a de que estava sendo perseguido de perto, então se afastou o máximo que pôde dos postes de iluminação.
(...)
A fila para a aquisição de bilhetes parecia não ter fim. Além disso, ele se sentia como se o espionassem... Haveria algum policial ali?
A moça da bilheteria quis saber para onde ele pretendia viajar... Ele perguntou sobre o destino do trem que partiria imediatamente... O trem tinha como destino a cidade de Campinas, mas de lá ele poderia prosseguir em outras composições para as partes mais remotas do país.
As demais pessoas da fila esboçavam descontentamento pela demora, então ele decidiu comprar a passagem.
Seu apavoramento só diminuiu quando se viu acomodado no vagão... Estava muito cansado... O trem deu o apito anunciando a partida e logo Miro se entregou ao sono. Só foi despertado após o comissário anunciar aos berros que já estavam em Campinas.
(...)
Miro decidiu comprar nova passagem com destino à divisa com o estado de Minas Gerais. Entrou no vagão de segunda classe, onde restava apenas um assento que estava voltado para outro banco.
O rapaz se acomodou, mas ao observar o tipo que estava à sua frente seus pensamentos se encheram de preocupações.
O homem não parava de olhar para ele... Os seus trajes (boné de lã com abas que cobriam as orelhas e terno azul sob longa capa escura), espessos bigodes e óculos com grossas lentes também chamaram a atenção de Miro.
Infelizmente tudo indicava que ele havia sido seguido e a polícia política estava prestes a prendê-lo.
Leia: A Legião Negra. Selo Negro Edições.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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