quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

“Ei! Tem alguém aí?”, de Jostein Gaarder – uma pescaria; revelações sobre a vida marinha no distante planeta de Mika

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder-ao.html antes de ler esta postagem:

Joakim pensou que havia muita sabedoria na conclusão de Mika sobre a importância do ovo na evolução da vida em nosso planeta, mas ficava sem entender a importância que o menino do espaço enxergava nos ovos e o seu interesse manifesto pelos dinossauros... Enquanto os dois conversaram sobre aqueles assuntos, Joakim permaneceu fazendo as cócegas no pescoço de Mika... Mas logo que ele parou, o outro se levantou e, em disparada, seguiu para a beira do mar. Isso causou preocupação a Joakim, que não tinha permissão dos pais para chegar até ali, além disso, não tinha certeza sobre as habilidades de Mika, se ele sabia nadar... Essas coisas.
Ele alcançou o amigo, que reconheceu o barulho provocado pelas ondas. Então perguntou se havia água em seu planeta... O visitante divertia-se com um punhado de algas que agitava, provocando respingos gelados nos dois. Em reposta à pergunta de Joakim, Mika disse que se houver vida em planetas que não possuam água, certamente os organismos vivente serão bem diferentes da vida terráquea e a de seu planeta. A resposta não foi “direta”, mas deu para concluir que sim, havia água no planeta do novo amigo de Joakim...
É claro, Mika não conhecia o nosso planeta, estava muito curioso e se encantava com as coisas que eram habituais para Joakim... Este, por sua vez, reconhecia que entre eles era o seu amigo que possuía algum conhecimento do espaço sideral... Então perguntou se ele achava que havia muitos planetas com água... A questão mereceu uma reverência, e foi respondida com um “acho que não” justificado pelo fato de a proximidade em relação à estrela provocar a evaporação, e o distanciamento provocar o congelamento.
Depois dessa resposta, Mika correu pelo ancoradouro, entrou num barquinho e começou a pular... Mais uma vez a preocupação tomou conta de Joakim, que foi em sua direção e disse para não pular daquele modo no barco... Logo imaginou que o outro começaria nova choradeira por causa da advertência, então propôs remarem um pouco... Essa ideia comprometia riscos porque o próprio Joakim não sabia remar muito bem... Em todo caso, aplicou-se a ensinar e a proceder como fazia quando remava com o pai, cada um operando um dos remos da embarcação... Foi assim que se afastaram consideravelmente da praia.
Deixaram-se ficar ao sabor da flutuação do barco... Encontraram tralha de pesca e não demorou até que Mika espetasse o dedo num dos anzóis... Neste ponto, o registro feito para a menina Camila (devemos lembrar isso) destaca que o menino Joakim notou o sangue diferenciado do amigo... Uma gota azul-escura! E assim ele teve certeza que o estranho amigo era mesmo de outro planeta... Joakim raciocinou sobre a impossibilidade de Mika ser um mamífero como os humanos, mas não conseguiu articular nenhum pensamento porque o outro iniciou a sua gritaria provocada pela dor, e ele teve de remediar com as carícias no pescoço... Explicou para que serve o anzol, e o aprendiz se deu muito bem, já que ao primeiro arremesso conseguiu uma bela fisgada... O garoto do espaço demonstrou forte emoção ao puxar o peixe para o barco...
Joakim disse que poderiam comer peixe antes das panquecas que tia Helena faria... Manifestando seu inconformismo com a façanha do amigo, já que o seu histórico em pescarias era dos mais pobres, perguntou se no planeta dele havia peixes... Entristecido, Mika negou balançando a cabeça... Então Joakim perguntou se havia outros animais no mar do planeta de Mika... Ele respondeu que, no passado, havia plantas e animais, mas a vida marinha tornou-se impossível devido à poluição que tomou conta das águas... Joakim também ficou triste ao ouvir aquela revelação... Propôs retornarem ao ancoradouro...
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder.html
Leia: Ei! Tem alguém aí? Companhia das Letrinhas.
Um abraço,
Prof.Gilberto

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

“Decamerão”, de Giovanni Boccaccio – o proêmio; alterações dos modos de velar os mortos; fim dos cortejos rituais; abandono e empilhamento de cadáveres

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/decamerao-de-giovanni-boccaccio-o_17.html antes de ler esta postagem:

O fato de inúmeras pessoas terem morrido em decorrência da peste devido à falta de quem as assistisse é mesmo lastimável. No proêmio do Decamerão temos uma noção do quanto os costumes relacionados aos cerimoniais de sepultamento foram alterados conforme a peste se tornou mais presente e agressiva em Florença por aqueles tempos... Estima-se que entre março e julho de 1348 mais de cem mil pessoas tenham morrido em seu perímetro murado.
Antes da peste, era comum a reunião de muitas pessoas na casa do defunto para que fossem prestadas as últimas condolências... Na sala, mulheres austeramente vestidas permaneciam reunidas em pranto... Havia grupos de mulheres que frequentavam regularmente os velórios... À frente da casa do morto se juntavam outros tantos, e a importância do falecido podia ser calculada a partir da quantidade dos que se aglomeravam e de quantos padres se acomodavam entre eles... O morto era conduzido dignamente por parentes e conhecidos mais chegados à igreja que havia definido para o seu sepultamento.
Mas a mortandade tornou-se rotineira... Os cerimoniais de despedida definitiva dos entes queridos deixaram de ser concorridos e perderam muito de sua sobriedade. Este fenômeno não ocorreu apenas entre as famílias mais abastadas, como se verá a seguir.
Aos poucos aconteceu de as pessoas morrerem sem que ninguém desse conta do ocorrido... A morte deixou de ser “episódio eventual”... Os velórios esvaziaram-se até mesmo pela ausência de parentes... Em vez de reuniões de luto, preferiam-se encontros festivos em que se trocavam relatos jocosos e gracejos descomprometidos sobre a situação...
As mulheres, que outrora desempenharam o coro choroso de tantos momentos piedosos, se acomodaram de bom grado aos novos hábitos... Entenderam mesmo que, dessa forma, contribuíam para a salvação da alma do morto...
Por outro lado, cresceu a quantidade de pessoas simples que combinavam um preço com os familiares do defunto e aceitavam carregar o caixão para sepultá-lo no templo mais próximo... Isso era realizado apressadamente sem que os desejos do falecido fossem considerados... A calamidade contribuía para que muitos cortejos prosseguissem até mesmo sem a presença de qualquer religioso...
A decadência dos costumes entre as famílias de posses abalou as consciências... Mas nada se compara à situação vivenciada pelos desfavorecidos e pela “gente da classe média”... Seus doentes e mortos acabavam abandonados em casa... Os viventes das proximidades sofriam a contaminação e disso resultava que, como não recebiam medicação ou ajuda de qualquer espécie, morriam aos milhares a cada dia.
Populações inteiras tornaram-se adoecidas e malcheirosas devido à peste. Acontecia de muitos mortos permanecerem dias a fio abandonados nas residências... O máximo que faziam por esses tipos era retirá-los e largá-los em frente à própria casa para que fossem vistos por alguém (dentre tantos que passaram a viver perambulando) disposto a providenciar algum caixão.
Também os caixões tornaram-se raros. Houve casos em que mais de um cadáver foi acomodado no mesmo caixão; e aconteceu de muitos outros serem acomodados em simples tábuas... Cortejos ocorreram sem que o padre soubesse ao certo quantos defuntos estavam sendo conduzidos...
Os “territórios sagrados das igrejas” foram abarrotados... Também esse antigo costume foi abalado, pois as covas que se abriam passaram a abrigar muitos féretros empilhados... Aconteceu, então, que os mortos deixaram de ser enterrados nas igrejas... Elas se tornaram sobrecarregadas, e os cemitérios proliferaram.
Os habitantes comuns das cidades, que levavam uma miserável vida de trabalhadores, também morriam desgraçadamente... Sem auxílio médico, morriam como animais... Os que lidavam nos campos deixaram de se importar com a produção e as criações foram abandonadas... Os animais percorriam os campos descontroladamente... Os camponeses também passaram a viver a existência daqueles que nada planejam ou esperam além da morte...
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/02/decamerao-de-giovanni-boccaccio-o.html
Leia: Decamerão. Editora Abril.
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Prof.Gilberto

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

“Ei! Tem alguém aí?”, de Jostein Gaarder – ao curioso Mika, Joakim explica a evolução da vida no planeta em que vive

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2012/12/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder_15.html antes de ler esta postagem:

Então aconteceu que Joakim decidiu que o melhor que tinha a fazer era levar o amigo Mika para avistar o mar... Dessa forma esperava livrá-lo dos olhares da tia Helena. Numa grande pedra acomodaram-se numa espécie de assento que a mãe do garoto chamava de “cadeira de pedra”. Ao lado de Joakim, Mika contemplava a tudo com muita curiosidade... A claridade do Sol ofuscava a sua visão e é por isso que ele cerrava os olhos procurando proteger-se... Mas a sua iniciativa seguinte foi tentar avistar a grande estrela através da lente. Ao notar o intento do outro, Joakim desesperou-se e, ao que tudo indica, puxou o seu braço dizendo para não fazer aquilo.
O viajante interplanetário voltou a berrar... Naturalmente, Joakim temeu que os gritos chegassem até a sua tia. Mas dessa feita já sabia como proceder e imediatamente fez carinhos e cócegas na nuca do outro... Depois que acalmou o amigo, Joakim pôde explicar que a lente poderia concentrar os raios solares de modo a cegá-lo.
Mika quis saber se o mar abrigava animais... Joakim respondeu que havia tantos quanto há em terra firme. O garoto visitante ficou esperançoso de ouvir que no mar havia dinossauros, mas o seu anfitrião (que colecionava livros sobre os animais pré-históricos e conversava com o pai sobre História Natural) falou que os dinossauros não mais existem... Emendou que todas as formas de vida existentes no planeta vieram do mar. Ao escutar com atenção essas informações, Mika perguntou se os seres humanos também têm a origem de sua existência no mar... Joakim reverenciou a pergunta e explicou que a origem da vida ocorreu há uns três bilhões de anos num único momento e, sendo assim, “plantas e animais da Terra estão relacionados uns com os outros”...
Mas eram os dinossauros que intrigavam Mika... Então, ao seu modo, Joakim explicou sobre eles... Falou das primeiras moléculas e das divisões que sofreram... Explicou sobre as alterações e diferenciações entre elas, o modo como cresceram e deram origem aos primeiros organismos unicelulares... Contou que milhões de anos marcaram a evolução desses organismos, que se tornaram multicelulares e deram origem a plantas e animais... Aqueles termos ainda eram muito recentes para Joakim, mas ele sentia necessidade de utilizá-los... Evidentemente Mika exigia maiores esclarecimentos, e é por isso que Joakim dava exemplos comuns, como o da estrela do mar, mostrando que nos animais multicelulares cada célula é diferenciada e tem “tarefa própria a cumprir”.
Pacientemente, Joakim foi mostrando o que conhecia sobre a evolução e falou que ela proporcionou o aparecimento dos peixes e anfíbios... O outro ficou intrigado ao saber que os anfíbios ainda existem (Joakim conseguiu citar os sapos e salamandras a título de exemplos), mas que o mesmo não ocorre com os dinossauros... Joakim falou que os dinossauros surgiram dos anfíbios, que os primeiros foram répteis, não existem mais, porém há muitas variedades de répteis e várias delas lembram os enormes dinossauros... O garoto viu que o seu curioso interlocutor prestava mesmo atenção a tudo o que dizia, pois emendou uma síntese perfeita sobre o que tinha entendido até então. Joakim ficou impressionado com o aprendizado do outro e com a própria capacidade de transmitir o que conhecia... Então prosseguiu dizendo que as mudanças de geração em geração são imperceptíveis, mas (apesar de se processarem em períodos que duram milhões de anos) elas ocorrem.
O visitante espacial ficou curioso sobre as diferenças entre anfíbios e répteis... Então ouviu que os anfíbios botam ovos na água assim como os peixes, já os répteis, que podem viver em praticamente qualquer ambiente, botam ovos rijos em terra firme... Mika percebeu que os répteis são “mais adiantados” que os anfíbios e quis saber se eles falam... Joakim achou graça e explicou que apenas os humanos têm essa habilidade. Foi então que Mika perguntou sobre a descendência humana... Joakim falou que os humanos são mamíferos e que estes se desenvolveram a partir dos répteis, porém não põem ovos, pois “dão à luz filhotes vivos”... Demonstrando dúvida, Mika questionou se os mamíferos não precisavam “botar um ovinho para dar à luz um filhote”...
Mais uma vez Joakim deu risada... Mas percebia que o amigo tinha uma ponta de razão, pois sabia que os mamíferos produzem ovos minúsculos conhecidos como óvulos que se desenvolvem dentro da mãe (é por isso que não precisam de casca dura)... Ele tinha alguma noção de que o ovo cresce dentro da mãe até a criança ficar pronta para nascer... Joakim considerava isso algo muito difícil de ser entendido, sabia que não tinha condições de explicar sobre aquelas coisas ao amigo... Mika permaneceu contemplando o mar e, enquanto refletia, apenas disse que “o ovo é um milagre”.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/ei-tem-alguem-ai-de-jostein-gaarder-uma.html
Leia: Ei! Tem alguém aí? Companhia das Letrinhas.
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Prof.Gilberto

sábado, 26 de janeiro de 2013

Considerações sobre Isidoro de Sevilha e sua época; um pioneiro do enciclopedismo

A propósito das postagens em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2010/11/mapa-de-isidoro-de-sevilha.html e http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2010/11/mapa-de-isidoro-de-sevilha-comentarios.html, seguem mais essas considerações.

Isidoro de Sevilha foi o principal intelectual da Espanha ao tempo da Alta Idade Média... Sua época (560-636) foi marcada por disputa político religiosa entre os adeptos dos conceitos do arianismo defendidos pelos visigodos, e os católicos vinculados à tradição romana. Isso à parte, havia ainda as tensões provocadas pelos bizantinos que, com Justiniano, significavam séria ameaça à autonomia local.
A família de Isidoro exilou-se devido às suas diferenças em relação à monarquia visigótica... Devemos considerar que os católicos saíram-se vencedores desse confronto, tanto é que há vários registros sobre a conversão dos monarcas visigodos ao catolicismo... Os familiares de Isidoro destacaram-se por seu engajamento nesse processo.


* Vale enfatizar que vários membros de sua família exerceram importantes ministérios religiosos e foram canonizados. Isidoro tornou-se bispo de Sevilha, tendo substituído o próprio Leandro. Também o irmão mais novo de Isidoro, Fulgêncio, recebeu uma Diocese. E Florentina, irmã de Isidoro, foi uma abadessa responsável por quarenta conventos. As contribuições intelectuais de Isidoro proporcionaram-lhe a canonização em 1598; ele também foi declarado Doutor da Igreja pelo papa Inocêncio XIII, em 1722 (sobre isso, ler http://pt.wikipedia.org/wiki/Isidoro_de_Sevilha).


Os pais de Isidoro faleceram e foi o seu irmão, Leandro, quem teve de dar conta de sua formação... Ela foi marcada por clericalismo e significativos conteúdos de cultura antiga. O Tratado sobre a natureza e suas Etimologias são suas principais obras... De alguma maneira, elas revelam o teor de sua formação intelectual...
Etimologias acaba se constituindo no que podemos chamar de primeira elaboração enciclopédica entre os ocidentais, uma tentativa de sistematizar o conhecimento que se havia elaborado até então... Filosofia, Medicina, Matemática, Direito, Ciências naturais, linguagens e artes domésticas contribuíram para esse trabalho... Ciência, artes liberais e a técnica de então fundamentaram a formulação dos conceitos. A título de registro, o método utilizado por Isidoro baseia-se no “sistema platônico de organização das ideias” (a palavra define a coisa que ela designa).
Enciclopedistas posteriores sempre levaram em conta a obra de Isidoro... Os seus textos foram retomados e complementados com registros de outros naturalistas (como os de História Natural, de Plínio, o Velho; e Maravilhas do Oriente, de Solinus). Rábano Mauro, que viveu entre 780 e 856, foi um dos que retomaram o método etimológico de Isidoro.
Para Rábano, Isidoro afastou-se dos princípios da sabedoria cristã (já que fazia referências a costumes pagãos nos enunciados explicativos dos conceitos)... O racionalismo de Isidoro foi criticado... É por isso que, a vários verbetes compilados pelo seu antecessor, Rábano omitia registros não cristãos e acrescentava elementos bíblicos.
Mesmo mais tarde os naturalistas sofreram duras críticas dos que consideravam imprudente o afastamento em relação aos textos sagrados para que explicações sobre o mundo e seus fenômenos fossem organizadas em manuais... O século XII foi marcado por elaborações de enciclopédias e por esse tipo de debate... O “banco de dados” proveniente de platônicos e aristotélicos era imenso e esse contexto prenunciou o “período mais fértil” do enciclopedismo, que ocorreu durante o século seguinte. Não foram poucos os enciclopedistas do período renascentista que recorreram aos textos de Isidoro.
Enciclopédias foram redigidas em diversas línguas, e não apenas em latim (que era para nobres e membros do clero)... Elas passaram a fazer parte de importantes acervos de universidades e mosteiros...
Não há como não destacar a contribuição intelectual de Isidoro de Sevilha...
A entrada da Biblioteca Nacional da Espanha (Madri) apresenta uma grande estátua do santo, considerado o padroeiro dos historiadores.

Este texto tem como inspiração os registros de Bernard Ribémont (Enciclopédia, a chave para o amplo conhecimento), especial para História Viva, da série Grandes temas, nº41: As conquistas da Idade Média.
Um abraço,
Prof.Gilberto

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

“Decamerão”, de Giovanni Boccaccio – o proêmio; relatos sobre a peste em Florença; alterações dos modos de viver e enfrentar a morte

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/decamerao-de-giovanni-boccaccio-o.html antes de ler esta postagem:

Em “A Primeira Jornada” (Pampineia) conhecemos os horrores provocados pela peste. É o autor quem chama a atenção das “adoráveis mulheres” (a quem o texto é oferecido) para o início da obra que poderá ser interpretado como triste e maçante... Considerações sobre a peste que tantos males provocou podem trazer lembranças muito desagradáveis aos que a ela sobreviveram. Porém os leitores não devem desanimar. Devem prosseguir rumo aos conteúdos mais agradáveis... Boccacio promete breves, porém necessárias, palavras sobre os tristes episódios (sobre isso ver http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/decamerao-de-boccaccio-interesse-pelo.html).
Ele faz referência à chegada da peste à cidade de Florença (a “mais bela das cidades da Itália”) no ano 1348... A doença que chegava aos viventes italianos havia atingido inicialmente o Oriente... As pessoas comuns interpretavam-na como um castigo divino... A "iniquidade reinante" sofreria expiação. Por onde passava, a praga aterrorizava, levando milhares à morte.
Boccacio garante que a cidade havia passado por prevenções, e funcionários foram contratados especificamente para tratar da limpeza... Doentes foram impedidos de ingressar em seu perímetro, e os habitantes receberam orientações diversas sobre a preservação de uma condição sanitária satisfatória. Isso à parte, também há que se ressaltar as súplicas dirigidas a Deus por pessoas pias e devotas.
No Oriente, quando uma vítima de peste começava a sangrar pelo nariz era sinal de morte certa... No começo da infecção, em Florença, notou-se vítimas masculinas e femininas sofrerem inchaços nas virilhas e axilas. Esses inchaços atingiam diferentes volumes nos infectados, e eram chamados de bubões pelas pessoas comuns... Aos poucos outras partes do corpo eram atingidas pelos tumores... Manchas negras substituíam as protuberâncias (daí o nome da doença), e elas eram notadas em todo corpo do adoecido... Assim como os bubões, elas variavam de tamanho. Em quaisquer dos sintomas, os familiares e pessoas conhecidas do infectado sabiam que eles significavam a chegada da morte para o adoecido.
Não havia remédio para a doença. Nenhuma forma de tratamento resultava em cura... Os remédios providenciados não provocavam nenhuma melhora, então imaginava-se mesmo que a doença fosse definitiva... Apareceram curandeiros, curiosos e “cientistas” que nunca haviam tido aula de medicina, candidatos a dar solução ao grave problema de saúde pública... Mas não se produziam resultados positivos, e a morte chegava ao contagiado depois de três dias de infecção... É certo que, para alguns, a morte tardava um pouco mais a chegar... Muitos morriam sem que tivessem contraído febre... A peste, além de tudo, era “misteriosamente violenta”.
Conviver com adoecidos tornou-se um problema. Todos sabiam que a contaminação era certa, “assim como fogo se espalha às coisas secas ou untadas”. A contaminação podia ocorrer através de simples conversa com o enfermo, ou até se houvesse contato com suas vestes. Dessa forma, tratar os doentes era arriscado demais para os sãos, que se contagiavam em pouco tempo...
Boccacio relata ter visto muitas situações de desespero provocadas pela doença. Em uma ocasião, viu que as roupas de uma das vítimas da peste foram atiradas à rua... Dois porcos começaram a farejá-las, mordê-las e sacudi-las... Uma hora depois, os dois animais entraram em convulsão e, como se envenenados estivessem, morreram ali mesmo.
Não demorou e os não contaminados passaram a evitar, de todas as formas, os enfermos... Sentiam nojo dos adoecidos... Não foram poucos os que procuraram formar grupos de “pessoas saudáveis” e se isolaram para garantir sua saúde. Esses trancavam-se em residências onde a doença não se manifestara... Passavam a levar uma vida sem extravagâncias, alimentavam-se do essencial e de bons vinhos... Entretinham-se do modo que podiam e evitavam saber notícias da realidade externa.
Houve os que pensassem de modo diferente e, em vez da reclusão, procuraram extravasar seus sentimentos. Perambulavam de uma parte a outra, rindo e bebendo muito, satisfazendo apetites que guardavam em segredo... Agiam sem reservas ou precauções porque avaliavam que bem pouco restava por viver... Faziam questão de encontrar outros tipos para manifestar suas opiniões sobre os ocorridos...
Casas abandonadas eram ocupadas por aqueles que a elas chegassem... Todos procuravam afastar-se o mais que podiam dos adoecidos.
A cidade, outrora uma joia, ficou largada. Não se viam mais autoridades civis ou religiosas... As funções administrativas não eram exercidas porque os responsáveis por elas estavam mortos, adoecidos ou aflitos pela perda de seus familiares. Sendo assim, os viventes estavam apartados de obrigações. Grupos sem escrúpulos podiam viver do jeito que bem entendiam...
Podemos dizer que entre os dois tipos de comportamentos citados anteriormente (os “comedidos reclusos” e os “extravagantes”) havia os grupos moderados, que não exageravam em seus modos. Vagavam, sim, de um lugar a outro, e por onde perambulavam eram vistos carregando flores e ramos aromáticos para afastarem de si os odores da peste, dos corpos adoecidos ou mortos, e dos remédios.
Muitos grupamentos humanos se deslocavam deixando o lugar onde viviam “antes que a peste os alcançasse”... Pensavam que a cólera divina talvez houvesse escolhido determinados perímetros e atingiria a todos os que neles insistissem em permanecer... O melhor que os não contaminados tinham a fazer era seguir o exemplo dos que decidiam partir.
Os antigos hábitos familiares de boa vizinhança e de camaradagem foram sendo desprezados aos poucos. Os parentes não mais se visitavam... Os que se contaminavam eram abandonados à própria sorte, pois o medo de contrair a doença era maior do que qualquer altruísmo.
Não é preciso dizer que também a criadagem tornou-se escassa... Seus serviços tornaram-se caríssimos. Ricos senhores e senhoras, quando adoecidos pagavam somas volumosas apenas para que suas solicitações fossem intermediadas por aqueles... Não foram poucos os que tiveram somente criados a velarem os seus últimos instantes de existência... A escassez de criados foi tal que muitas damas viveram momentos de intimidade jamais pensada ao terem de mostrar o corpo desnudo a um criado (moços ou velhos), algo que em tempos comuns ocorreria apenas entre mulheres... Para muitas das que sobreviveram à peste, essa situação resultou em “deslizes e desonestidades”.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/decamerao-de-giovanni-boccaccio-o_29.html
Leia: Decamerão. Editora Abril.
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Prof.Gilberto

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

“Decamerão”, de Giovanni Boccaccio – o proêmio; condição de fragilidade das mulheres a quem as novelas são dedicadas

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/decamerao-de-boccaccio-interesse-pelo.html antes de ler esta postagem:

 Na abertura do proêmio se lê: “Tem início aqui o livro chamado Decamerão, conhecido por Príncipe Galeotto, no qual estão contidas cem novelas, narradas em dez jornadas, por sete mulheres e três homens jovens”.
Notamos a amargura daquele que viveu uma grandiosa paixão... Tendo se entregado desmedidamente a ela, veio a se angustiar de modo depressivo... Calculamos sua desventura a partir da afirmação de que só não sucumbiu graças aos “raciocínios de algum amigo”... O trauma daquele sofrimento chegou ao fim, mas tal amor jamais seria totalmente dissipado.
É por gratidão que escreve... O texto que produz é uma oferta àqueles que o ajudaram... Reconhece que, naturalmente, os que se demonstraram verdadeiras fortalezas não tenham necessidade de nada do gênero... Nesse caso, é de se esperar que os que padecem infortúnios semelhantes ao que ele próprio viveu possam tirar algum proveito... Ao menos darão atenção especial às narrativas e as entenderão.
O proêmio ajuda-nos a conhecer a condição da mulher (de família abastada) do século e a dos homens do século XIV. Evidentemente não é este o objetivo desta parte do livro, mas não há como não tecermos observações a respeito.
O texto, enquanto “alívio e conforto” aos que sofrem, segue dedicado “mais às mulheres belas do que aos homens”. A partir das considerações do autor, elas se apresentavam mais vulneráveis que os homens, e por isso careciam amparo. Depreende-se que as mulheres amam ardorosamente, “receiam envergonhar-se e retraem-se”; possuem desejos sufocados pelas imposições de pai e mãe, e sofrem silenciosamente a condição de submissas aos homens... Não há como se imaginar que sua situação proporcionasse satisfação e deleite, já que apenas na solidão de seus pensamentos conseguiam consolação... Sem possibilidades de alcançar compreensão e mudança de seu estado de ânimo, permaneciam solitárias e necessitando de amparo.
Bem diferente era a condição masculina. Nos casos de melancolia, o homem tinha possibilidades de buscar entretenimentos diversos, fosse “armando armadilhas para os pássaros”, jogando, caçando, pescando ou cavalgando...
As novelas (parábolas, fábulas ou estórias) de O Decamerão destinam-se, então, às frágeis mulheres... Para aquelas que amam e não têm nenhum refúgio (obviamente não se trata aqui daquelas que em seu cotidiano lidavam com agulha, fuso e roca)...
“Prazer, conselho e exemplos”, embora direcionados para o bem e o reconforto, podem provocar certos aborrecimentos... É claro que o autor espera que seu livro não encaminhe os leitores para as mesmas sensações, todavia é ele mesmo quem adverte que as novelas relatam casos de amor, “uns agradáveis, outros escabrosos”... As mulheres que eventualmente tomarem conhecimento dos enredos poderão se beneficiar de algum conforto... Escolhas deverão ser feitas por elas, que deverão saber o que poderão seguir ou refutar.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/decamerao-de-giovanni-boccaccio-o_17.html
Leia: Decamerão. Editora Abril.

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Prof.Gilberto

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

“Decamerão”, de Giovanni Boccaccio – interesse pelo texto a partir da leitura de “O Queijo e os Vermes”

Foi a citação em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2012/11/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg_28.html, sobre a lenda dos três anéis, que impulsionou o interesse pelo Decamerão, escrito entre 1348 e 1353 por Boccaccio (1313-1375).
A ideia aqui é a de esclarecer o conto em questão... Ele é o terceiro de cem novelas que compõem o livro... Já que está no início da obra, não custa elaborar uma apresentação um pouco mais detalhada... Mas o primeiro interesse aqui é conhecer o conteúdo que tanto empolgou o moleiro Menocchio (personagem principal de O Queijo e os Vermes)...
Pode ser que postagens sobre os demais contos também apareçam por aqui. Isso depende de disponibilidade, empolgação em relação ao material e “outras demandas”.
Muitos conhecem trechos do livro apenas a partir de releituras para o teatro e o cinema. Não são poucos os casos (das releituras) em que vemos evidenciados apelos aos detalhes mais sensuais das narrativas... Então, conhecer o contexto em que a obra foi escrita, bem como as considerações anteriores do autor, torna-se relevante.
Evidenciar apenas os detalhes mais sensuais seria produto de uma interpretação “viciada”?Também para refletirmos sobre esse tipo de questionamento, o incentivo à leitura do texto vale à pena...
Início de conversa:
O cenário gerado pela Peste Negra, que dizimava populações inteiras por onde passava, é o “pano de fundo” da narrativa. Em 1348 ela chegou a Florença... Os que sobreviviam à pandemia assistiam a ruína (também) de suas certezas fincadas na moral religiosa.
A condição de “condenados pela Peste”, naturalmente, levaria os mais jovens a inquietações em relação à incerta e curta vida que teriam... Em Decamerão assistimos a reunião de dez jovens (moços e moças mais os seus criados) com a intenção de percorrer lugares solitários, onde se entreteriam a partir de regras próprias e se revezariam na narração de histórias... Para eles, a incerteza da tênue existência não deveria se constituir em peso e seus sentimentos não deveriam ser abafados...
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/decamerao-de-giovanni-boccaccio-o.html
Leia: Decamerão. Editora Abril.
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Prof.Gilberto

domingo, 13 de janeiro de 2013

“O Queijo e os Vermes”, de Carlo Ginzburg – livros e contato do camponês com termos acadêmicos; o método “Fioretto della Bibbia”

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/01/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg.html antes de ler esta postagem:

Sem dúvida, o movimento reformista e a prensagem de textos foram acontecimentos importantes... No caso em questão, permitiram que um tipo como Menocchio, de provinciana comunidade, pudesse vivenciar as situações relatadas... Como sabemos, ele acabou sustentando ideias muito perigosas para o seu tempo...
Em consonância com o pensamento reformista, Menocchio levou a cabo a prerrogativa de falar sobre o que pensava da Igreja e do mundo que o cercava... Em relação aos textos impressos, sabemos o quanto foram utilizados (à sua maneira), e como se apropriava de trechos, frases e palavras para justificar o seu pensamento ante as autoridades religiosas... Notamos que, oriundo de um meio analfabeto, o moleiro valorizava os conteúdos implícitos nos textos a que tinha acesso... Seguia posicionando-se desafiadoramente ao sentenciar que os inquisidores e as demais autoridades religiosas jamais admitiriam que os pobres conhecessem o conteúdo que eles tinham por exclusivo.
As palavras de Menocchio mesclavam termos comuns do cotidiano camponês a palavras acadêmicas... No Fioretto della Bibbia ele teve acesso a conceitos “perfeito”; “imperfeito”; “substância”; “matéria”; “vontade”; “intelecto”; “memória”... Eles aparecem em seus depoimentos mesclados a outros do cotidiano camponês: “criança no ventre da mãe”; “rebanho”; “carpinteiro”; “banco”; “trabalhador”; “queijo e vermes”...
No capítulo III do Fioretto (como Deus não pode querer o mal e muito menos recebê-lo) nota-se a mistura dos termos cotidianos aos acadêmicos... Há um trecho que justifica o enunciado garantindo que Deus “ordenou os elementos de forma que um não interferisse no outro (...). Alguns dizem que o mundo durará eternamente, (...), quando um corpo morre, a carne e os ossos voltam àquela matéria a qual foram criados (...) podemos ver facilmente a função da natureza, como ela concilia coisas discordantes de modo que todas as diversidades são reduzidas à unidade, (...) em cada substância: e combina também em plantas e sementes”.
Na sequência temos os exemplos da combinação do homem e da mulher; e o do planeta Júpiter, que gera outras criaturas (e através dele) outras são geradas de acordo com a ordem na natureza.
O Fioretto usava o método escolástico (enunciado de uma tese e o desmantelamento de “opiniões errôneas”). Embora “pobre e desordenado” este material aguçou a curiosidade intelectual de Menocchio... O Fioretto fazia ataque às especulações filosóficas acerca da alma (no capítulo XXVI: como Deus inspira as almas nos corpos; se são eternas; se são uma e os elementos quatro e mais o Orbis do qual Deus teria feito a alma de Adão e todas as demais; se são espíritos malignos que decaem e entram nos corpos humanos um após o outro conforme morrem, ...).
A reação de Menocchio aos ataques do Fioretto àquelas livre-interpretações foi a de “procurar coisas maiores” e, incentivado pela pluralidade de ideias, formular o seu próprio pensamento servindo-se de conjecturas diversas, que não lhe pertenciam... O resultado foi a mistura de idéias (“embebidas de cristianismo, neoplatonismo e filosofia escolástica”) que justificavam o “materialismo elementar” transmitido oralmente entre os camponeses.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/03/o-queijo-e-os-vermes-de-carlo-ginzburg.html
Leia: O Queijo e os Vermes. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto 

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Sítio da Família Silotto em Serra Negra

A região do “Circuito das Águas Paulista” oferece várias opções turísticas. O blog já apresentou algumas considerações sobre Amparo e Monte Alegre do Sul. Nesta primeira semana de Janeiro estivemos em Serra Negra (oportunamente escreveremos algo sobre a estadia). Reservo este espaço para o sítio São Pedro, da Família Silotto, localizado na rodovia Serra Negra-Lindoia (km 158,5).
A simplicidade do lugar e a simpática recepção dos proprietários são marcantes...
Os quiosques são um convite para um tempinho a mais... A natureza preservada e sua agradável atmosfera envolvem o sítio. As crianças podem curtir o playground e contemplar as aves e outros animais de fazenda.
Na lojinha há vários artigos artesanais... A degustação (evidentemente proibida aos menores) é acompanhada de conversa sobre os ciclos de produção, o parreiral e a propriedade centenários... Os que desejam experimentar um contato maior com a lida do campo são convidados a visitas oportunas para conhecer a produção das bebidas, e até a participar de colheitas e outras atividades.
Cachaças, vinhos, grappa, licores, vinagres e sucos  são suas especialidades... Doces, salames e molhos de pimenta feitos na região estão expostos nas prateleiras... Ali também se produz café (muito bom)... Há uma grande variedade de frutas e a apicultura tem o seu potencial.
Mais informações em www.familiasilotto.com.br.
Um abraço,
Prof.Gilberto 

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