sábado, 9 de outubro de 2010

Considerações sobre "Vigiar e Punir", de Michel Foucault

Observe esses títulos: Doença Mental e Psicologia (1954); História da Loucura (1961); Nascimento da Clínica (1963). São livros da autoria de Michel Foucault e, a partir deles, podemos ter uma ideia das áreas de interesse desse polêmico filósofo, também formado em Psicopatologia, do século passado. Não li nenhum desses títulos anteriormente relacionados, mas no início da década de 1980 li Eu, Pierre Rivière, tendo degolado minha mãe, minha irmã e meu irmão... (1973) do mesmo autor. Não possuo mais aquele exemplar que adquiri em um sebo... Mas lembro do texto que era repleto de informações dos autos do processo criminal, um verdadeiro dossiê. Desse autor temos o Microfísica do Poder (1979), que pretendo ler futuramente... Aqui, deixo registradas algumas considerações sobre Vigiar e Punir (1987) que li há uns seis anos. O tempo passou, mas tenho na memória algumas impressões sobre aquele aprendizado.


Minhas considerações:
Por um bom tempo os crimes foram punidos com a mais extremada violência. As punições eram eventos concorridos, pois aconteciam a céu aberto e atraiam milhares de curiosos, em sua maioria sedentos por um espetáculo cruel que se encerrava com a morte do criminoso. Assim era porque, na verdade, o criminoso, qualquer que fosse o seu delito, havia atentado contra a figura do próprio monarca, ao seu poder (considerado divino) e aos princípios doutrinados pela Igreja Católica. Sua morte devia assustar para servir de exemplo. Mas não era apenas isso.

A execução era lenta... Bem lenta... O punido praticamente assistia à própria morte ao sofrer torturas em instrumentos inventados durante a Idade Média. Em algumas ocasiões ele podia até receber certas consolações ou mesmo curativos para prosseguir sofrendo as torturas. Não faltava a figura do religioso sempre a questionar se o punido se arrependia dos males que cometera... Interessante observar que às vezes em que o instrumento que dava cabo à vida do sentenciado falhava, ouviam-se protestos dos populares para que sua vida fosse poupada, como se a falha fosse uma providência divina... Há muitos relatos sobre situações assim...
Tínhamos, então, um verdadeiro suplício do corpo. Punição, imposição do Estado Absolutista, significava fazer sofrer o condenado. Com isso todos sabiam quem tinha autoridade, e quem tinha se distanciado da Lei e dos princípios religiosos.

As punições que evitavam lentas agonias foram preocupações dos esclarecidos iluministas. Para esses, a sociedade humana devia ser orientada pelo Contrato e aqueles que cuidaram das punições durante o Antigo Regime podiam ser considerados exemplos fiéis do “atraso”, do “primitivismo”. Assim, os iluministas criticaram severamente os modelos de punição que evidenciavam o suplício do corpo do condenado. O final do século XVIII foi repleto de invenções para provocar mais “humanidade” nas condenações, a guilhotina foi uma delas...

Muito se discutiu sobre a eficácia das penas impostas aos crimes. Condenação à prisão foi uma alternativa proposta pela sociedade liberal, que surgiu com o fim do Antigo Regime após as revoluções burguesas. É claro que já existiam prisões, mas não com a característica de torná-la um estágio para a reeducação social... Os iluministas defendiam que as punições aos crimes devem ter essa característica regeneradora. Uma sociedade próxima da perfeição não pode conviver com a “carnificina” dos tempos anteriores.

As prisões, então, tornam-se ambientes disciplinadores por excelência. A palavra “cadeia” tem a ver com a disciplinada fila dos condenados “em cadeia” seguindo para sua prisão... O Panóptico resolveria com eficiência a necessidade de vigiar os inscritos nessas instituições. Os panópticos seriam modelos arquitetônicos em que os encarcerados sentiriam-se constantemente vigiados pela autoridade disciplinadora. Então, essa concepção gerava atenção e obediência a um eficiente poder e, ao mesmo tempo, tornava homogêneos os comportamentos dos prisioneiros... Outros mecanismos, como o respeito ao posicionamento geográfico de cada um dos vigiados nos ambientes prisionais, as atividades laboriosas que deviam cumprir, e a “monitoria” realizada pelos indivíduos de melhor comportamento, também serviriam para disciplinar.

Hospícios, hospitais e escolas também acabaram seguindo esses conceitos disciplinadores. De tudo isso, fica-nos a reflexão sobre os formatos disciplinadores, se ainda não são, de certa forma disfarçados, por suas pressões psicológicas e diversos métodos legados do passado, outros modos de suplício do corpo.

Um abraço,
Prof.Gilberto

Leia: Vigiar e Punir. Editora Vozes.

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